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RECICLA MAIS: O QUE DIZ A NOVA LEGISLAÇÃO SOBRE A LOGÍSTICA REVERSA DAS EMBALAGENS

Luciana Lopes
Luciana Lopes
Geógrafa, Mestre em Gestão dos Resíduos Sólidos pela Universidade de São Paulo, atua há 20 anos na organização de sistemas de coleta seletiva. Autora na publicação “Do Lixo à Cidadania: guia para formação de cooperativas de catadores de materiais recicláveis”. Diretora da Visões da Terra, consultoria de projetos socioambientais que apoia na organização da gestão dos resíduos sólidos em 23 municípios no Brasil.

O novo decreto de logística reversa abre caminho para que as prefeituras possam obter créditos de reciclagem, mas não soluciona a fiscalização

A Lei 12305/2010 que regulamentou a Política Nacional de Resíduos Sólidos foi, sem dúvida, um marco fundamental para a gestão e gerenciamento de resíduos no país. A lei estabeleceu prioridades, metas e responsabilidades sobre o ciclo de vida dos produtos erroneamente descartados. Para as empresas produtoras de embalagens, bem como seus importadores, distribuidores e comerciantes, estabeleceu a responsabilidade da logística reversa, que foi detalhada a partir de acordos com os setoriais. Dessa forma foram assinados acordos com os setores de embalagens em geral, medicamentos, eletroeletrônicos e seus componentes, pneus, óleos lubrificantes, pilhas e baterias: cada um com metas e estratégias específicas de atuação.

Os acordos setoriais de embalagem abriram um novo caminho e novos mercados pois, na impossibilidade de que cada empresa ou setor produtivo organizasse um sistema de recolhimento próprio, foram estabelecidos programas empresariais que firmavam acordos com recicladores, onde as notas fiscais de venda das embalagens para a reciclagem servem como crédito para comprovação da logística reversa realizada. 



A falta de uma regulação nesse sistema passou a gerar alguns graves problemas. Diversas empresas passaram a comercializar “créditos de reciclagem” sem necessariamente que estes tivessem um lastro. Como exemplo, uma cooperativa de reciclagem poderia vender os materiais recicláveis coletados das mãos do consumidor a um aparista intermediário, que por sua vez o encaminharia a indústria recicladora. Sem o devido rastreamento, a Nota Fiscal de venda dessa cooperativa ao intermediário geraria créditos de reciclagem e a Nota fiscal de venda desse mesmo material do intermediário à indústria também geraria um crédito, que poderia ser adquirido por outro programa empresarial. Assim, o mesmo material seria contabilizado duas vezes, criando números irreais de cumprimento das metas de reciclagem.

O decreto apresenta como avanço a figura da entidade gestora, definindo que somente organizações constituídas por empresas dos setores produtivos podem emitir créditos de reciclagem e que estes precisam ser rastreados em todas as etapas da cadeia através do Manifesto de Transportes dos Resíduos (MTR), garantindo um certificado de destinação final (CDF) apenas quando este material é efetivamente reciclado. Essas entidades gestoras devem contratar verificadores independentes que averiguam a veracidade das notas fiscais, MTR’s de CDF’s recebidos.  

Como pontos de alerta, o decreto ainda apresenta falhas de controle do sistema, visto que não instituiu um ente público de fiscalização dos créditos emitidos pelas entidades gestoras. Pretende-se que o próprio mercado regule a sua atuação, através da criação de um grupo de acompanhamento e performance organizado por todas essas entidades gestoras, mas sem especificar como será sua atuação ao verificar falhas ou quem e como irá puni-las. Esse risco aumenta com a abertura da possibilidade de que qualquer parte da cadeia da reciclagem (cooperativas, intermediários, prefeituras e outros) possam obter créditos, o que proporciona ganhos de escala, mas amplia o risco de duplicidade.

Cabe sempre ao poder público regulamentar as políticas necessárias para garantir o bem-estar coletivo e fiscalizar o cumprimento do que foi instituído. Delegar a função pública de fiscalização no cumprimento das regras para quem as deve cumprir e não estabelecer uma forma de punição a quem não as cumpre pode colocar em risco todo um marco legal constituído. Afinal, se a fiscalização é frágil, a motivação também aferrece.   

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities 

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