Comentário preparado para evento sobre o novo marco da P3C
saneamento
Marco do saneamento já produziu avanços…
• Do ponto de vista da responsabilidade social, é fundamental estimular o investimento para atingir a universalização de água e esgoto até 2033. O sucesso nessa empreitada depende de grande volume de inversões públicas e privadas o que, por sua vez, requer uma regulação simples, clara e independente.
• Um dos aspectos mais importantes do novo marco do saneamento (Lei nº14.026/20) foi precisamente conferir a uma agência reguladora independente como a ANA o papel de supervisão regulatória de forma a contribuir com as agências infranacionais na construção institucional em prol da excelência técnica e independência.
• Para tanto é imperativo harmonizar a regulação em setor no qual há nada menos do que 86 agências infranacionais, sendo 26 estaduais, 19 intermunicipais e 41 municipais.
• Segundo BNDES, Caixa Econômica e B³, após a promulgação do novo marco do saneamento foram realizados 13 grandes leilões, somando R$ 65,5 bilhões em investimentos contratados para os próximos 35 anos, beneficiando 31,2 milhões de pessoas.
• Além destes leilões maiores, o Radar PPP reportou a publicação de 238 procedimentos de manifestação de interesse (PMI) para os segmentos de água e esgoto, equivalente a 16% do total de 1448 PMIs publicadas e 191 PMIs para resíduos sólidos, perfazendo 12% do total.
Não dá para pensar em desenvolvimento com as crianças brincando no esgoto
• O novo marco não está restrito a água e esgotamento sanitário. Em 2021 a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) publicou a Norma de Referência nº 1 que dispõe sobre o regime, a estrutura e parâmetros da cobrança pela prestação do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU), bem como os procedimentos e prazos de fixação, reajuste e revisões tarifárias.
• Segundo o SNIS 2021, existem cerca de 2.100 unidades de disposição inadequada (lixão ou aterro controlado) para resíduos sólidos.
Não dá para pensar em desenvolvimento com crianças tendo que sobreviver em lixões
O marco do saneamento permitiu um salto em investimento, mas é preciso muito mais…
• Na falta de investimento não há serviços satisfatórios para a maioria da população com mais de 30 milhões de pessoas sem água tratada, mais de 100 milhões sem coleta de esgoto, enquanto as perdas na distribuição de água chegam a cerca de 40%.
• O sucesso dos leilões realizados após a aprovação do novo marco é apenas o início de um longo caminho.
Serão necessários novos saltos no investimento. Segundo dados do SNIS, o investimento médio do período de 2015/21 foi de R$ 17 bilhões¹. A GO Associados estima que o nível necessário de investimento anual em água e esgoto para universalização chega a R$ 36,2 bilhões, o que exigiria praticamente dobrar o patamar atual.
• Outros exercícios de projeção chegam a números superiores de investimento necessário para a universalização. Novas estimativas da GO Associados chegaram a R$ 500 bilhões até 2033.
• O desafio é ainda maior quando se considera que este valor de investimento anual necessário para universalização não inclui as inversões necessárias em manejo de resíduos sólidos e drenagem. A GO Associados estima que seriam necessários R$ 70 bilhões e R$ 250 bilhões nestas duas áreas, respectivamente, para garantir atendimento universal.
• O caminho é desafiador, mas os benefícios são enormes. O modelo de insumo produto aplicado em estudo da GO Associados para o Instituto Trata Brasil revelou que um investimento anual de R$ 36,2 bilhões para universalização dos serviços até 2033 acarreta efeitos multiplicadores expressivos com os seguintes aumentos de:
• 851 mil empregos
• R$117 bilhões de produção
• R$ 2 bilhões de arrecadação de impostos
Sem o salto do investimento, os pobres continuarão pagando pela falta de saneamento…
• Boa regulação e competição viabilizam investimentos sem onerar excessivamente a população e sobretudo os mais pobres. Estes são os que mais sofrem com a falta de saneamento pela exposição às doenças e por habitar em áreas de risco, degradadas pela poluição dos cursos d´água e sujeitas a enchentes e deslizamentos.
• Os números sugerem que as estruturas tarifárias podem ser mais progressivas cobrando
proporcionalmente mais dos ricos e menos dos pobres. O preço médio da tarifa de água é relativamente baixo, mas muito mal distribuído, onerando os mais pobres que ficam sem os serviços básicos.
• Uma caixa d’água de 1000 litros tem o mesmo valor de 2 garrafas de água (1L) que podem ser compradas no supermercado. Segundo o SNIS 2021, a tarifa média no Brasil é de R$ 4,81 por m³ que multiplicada por 1.000 litros vale R$ 4,81, equivalente a cerca de duas garrafas de 1 litro. Ou seja, mil litros de água tratada valem apenas dois litros de água engarrafada!
- Segundo a ponderação do IPCA de 2022 calculado pelo IBGE e baseado na Pesquisa de Orçamento Familiar 2018, o peso da conta de energia representa mais do que o dobro da água e esgoto.
- A boa regulação e gestão podem promover estruturas tarifárias mais justas nas quais as famílias carentes tenham tarifa social. No entanto, segundo o SNIS, a tarifa social tem uma baixa representatividade no Brasil, alcançando apenas 5% da população.
• Segundo informações do mesmo SNIS, 18 dentre as 27 Companhias Estaduais tem um alcance da tarifa social inferior a 5%. Além disso, há uma grande variância, indicando falta de critérios claros e foco nas famílias do cadastro único.
• Os contratos estruturados mais recentemente pelo BNDES (Alagoas, Amapá, Rio de Janeiro e Ceará) possuem mecanismos mais adequados para incentivar o incremento da participação da tarifa social nos contratos, alcançando um número maior de famílias.
• Nestes contratos, caso a participação da tarifa social ultrapasse um determinado patamar (por exemplo, mais do que 5% dos usuários), há um ajuste automático da tarifa para que exista uma compensação.
Dessa forma, cria-se um incentivo adequado para que a conta de água tenha uma maior
representatividade em relação à renda das famílias, além de potencialmente aumentar a base de clientes do serviço.
¹ Preços de dezembro 2020 Gesner Oliveira: Doutor em Economia, Professor da FGV e sócio da GO Associados, Pedro Scazufca:Mestre em economia e sócio da GO Associados, Lucas Godoi: Mestre em Economia, Luccas Saqueto: Mestre em economia, Vicente Santos: Mestre em Economia