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¡AGUAS! É PRECISO PADRONIZAR PARA UNIVERSALIZAR O SANEAMENTO NAS CIDADES BRASILEIRAS

Patricia Pessoa Valente
Patricia Pessoa Valente
Doutora e mestre em Direito do Estado pela FD-USP. LLM pela LSE. Pesquisadora do Centro de Regulação e Democracia do INSPER. Sócia do Pessoa Valente Advogados Associados, escritório especializado em Direito Público e Regulação.

No Brasil, para mudar a realidade de quase 100 milhões de pessoas desassistidas do serviço de coleta e tratamento de esgoto, a Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020 (o Novo Marco do Saneamento) impôs a meta de universalização do serviço de esgoto para 90% da população até dezembro de 2033

No México, é costume usar a expressão “¡Aguas!” como sinônimo de “Cuidado!”. Pode parecer um tanto sem sentido para pouco mais da metade da população brasileira, que tem acesso aos serviços de tratamento de esgoto (SNIS 2020). A origem dessa expressão mexicana remonta à Espanha da Idade Média. Não sendo provido um serviço de coleta de esgoto pelo poder público, passou a ser uma atribuição dos próprios cidadãos. Assim, para se livrarem das próprias fezes, as pessoas as misturavam com outros dejetos e água em baldes, e despejavam todo seu conteúdo nas próprias ruas. Para alertar aqueles que passaram por ali, virou costume gritar “¡Aguas!” como alerta para o que estava por vir das casas. 

Desafios do saneamento básico no Brasil

No Brasil, para mudar a realidade de quase 100 milhões de pessoas desassistidas do serviço de coleta e tratamento de esgoto, a Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020 (o Novo Marco do Saneamento) impôs a meta de universalização do serviço de esgoto para 90% da população até dezembro de 2033. Atualmente, apenas 54,1% das brasileiras e brasileiros têm acesso a esses serviços, sendo a porcentagem ainda mais baixa em algumas regiões:  no norte do país, corresponde a somente 12,3% da população e, no nordeste, a 28,3% da população da região. 



Os desafios são de diferentes tipos, compreendendo desde a atração de investimento privado, diante da insuficiência do poder público de fazer frente ao financiamento da construção e operação da infraestrutura necessária, com a modelagem econômico-financeira e jurídica de concessões de longo prazo, até a construção de uma cultura de fortalecimento da capacidade institucional das administrações públicas para garantir segurança jurídica e previsibilidade para a gestão dos correspondentes contratos de concessão.

Nesse contexto, aqui vai o alerta: seja o município ou qualquer outra forma de prestação regionalizada, os poderes concedentes dos serviços de esgotamento sanitário deverão se valer da padronização dos contratos e das boas práticas regulatórias para atingir as metas de universalização impostas.

Ainda que cada concessão guarde suas especificidades (p. ex.: volume de investimento necessário para fazer frente à demanda identificada), é fundamental que os projetos de saneamento possam se aproveitar da experiência já acumulada em outros setores ou em projetos que contaram com a assessoria do BNDES, CEF, entre outros para sua estruturação. Será fator decisivo, para a universalização de todos os serviços de saneamento básico, a padronização, sempre que possível, de métodos de análise da demanda, parâmetros para avaliação dos aspectos econômico-financeiros essenciais para definição do valor e prazo da concessão, bem como a utilização de modelos de contratos cujas principais cláusulas tenham sido escritas baseadas nas melhores práticas regulatórias e nos entendimentos jurisprudenciais sobre o tema.

Normas de referência em saneamento

A padronização, também, é o racional que sustenta a competência normativa da Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) para editar normas de referência em saneamento. Fazendo uso de regulação por incentivo, o Novo Marco do Saneamento conferiu à ANA a tarefa de disciplinar regras gerais de referência sobre, por exemplo, “padrões de qualidade e eficiência na prestação, na manutenção e na operação dos sistemas de saneamento básico”, “regulação tarifária”, “critérios de contabilidade regulatória” dentre outros assuntos que, se uniformizados, gerarão eficiência para o poder público e para a iniciativa privada. 

Os poderes concedentes que adotarem essas normas de referência poderão oferecer a possibilidade de os investidores terem acesso a financiamento com recursos da União ou com recursos do BNDES, CEF ou outro órgão ou entidade da administração pública federal. Da perspectiva do investidor, reduz-se o custo de elaboração da proposta e aumenta-se a confiança na boa gestão contratual. Para o poder público, também aumentam suas chances de um retorno mais promissor, quando da licitação para a concessão com as perspectivas de melhores lances por parte dos potenciais investidores. Padronizar, portanto, deve ser o alerta para a universalização dos serviços de saneamento básicos.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities  

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