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A RECUPERAÇÃO VERDE E O TRANSPORTE PÚBLICO 

Ilan Cuperstein
Ilan Cuperstein
Vice-diretor regional da C40 para a América Latina. Profissional com mais de 10 anos de experiência internacional em mudanças climáticas, energia e políticas urbanas, no Brasil, China e América Latina. Bacharel em Relações Internacionais pela PUC-RJ e mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela London School of Economics.

Uma das principais lições da pandemia é a importância de se investir em serviços públicos robustos de qualidade, incluindo a infraestrutura de transporte, fundamental para se garantir um futuro justo, próspero e sustentável 

O transporte público foi um dos setores mais afetados pela pandemia na América Latina, com quedas que variam de 20% a mais de 65%, no número de viagens em janeiro de 2021, dez meses após o anúncio das primeiras medidas de quarentena na região, conforme dados do Painel de Impacto do Coronavírus, iniciativa do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e BID Invest. 

Esta queda acentuada tem pressionado cada vez mais um setor que já enfrentava desafios de retenção e adição de passageiros antes da pandemia e criou um desequilíbrio financeiro de bilhões de reais. Somente no Brasil, em 2020, o impacto no setor de transporte coletivo urbano decorrente da Covid-19 chegou a R$9,5 bilhões, segundo a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU).



Com números preocupantes, se acentua a necessidade de incluir o sistema de transporte coletivo e público urbano em qualquer estratégia de recuperação econômica verde e justa. Trabalhadores do setor, sindicatos e prefeitos de cidades como Los Angeles, Milão, Jakarta e Joanesburgo se juntaram para demandar que governos façam urgentemente injeções de fundos nos serviços e na infraestrutura de transporte público, com o objetivo de criar milhões de empregos e também combater a outra, mais longa e desafiadora, crise global das mudanças climáticas. 

Este movimento faz ainda mais sentido no contexto latino-americano, tendo em vista que se trata de uma das regiões mais urbanizadas do mundo e também uma das regiões com maior uso proporcional do transporte público, com 6 das 15 cidades com a maior porcentagem de viagens por este meio no mundo.

A América Latina e a crise sanitária 

A América Latina, puxada por Brasil e México, infelizmente ainda passa por um momento agudo da crise sanitária e humana da pandemia, com seguidos recordes trágicos de infecções e mortes diárias. Por isso, as medidas de isolamento social e restrições ainda fazem parte do cotidiano, o que significa que o uso do transporte público deverá apresentar números baixos de viagens ao menos pelos próximos meses. 

Isto não quer dizer que medidas para apoiar e fortalecer o setor não devam ser implementadas imediatamente. Muito pelo contrário, ações como o acordo de co-financiamento do déficit fiscal do sistema de transporte público de Bogotá, assinado no final de março pela Prefeita Claudia López e o Ministro da Fazenda colombiano, Alberto Carrasquilla, são exemplos a serem seguidos por outros países. O governo federal brasileiro foi no caminho oposto ao vetar o socorro de R$4 bilhões para os transportes públicos no final de 2020 e deveria rever sua posição urgentemente para manter a sobrevida do setor.

Como enfrentar a crise? 

Com este mesmo objetivo, a C40, rede de megacidades globais comprometidas em enfrentar a crise climática, em parceria com diversas organizações como a International Trade Union Confederation (ITUC), a International Association of Public Transport (UITP) e a Women in Informal Employment Organizing and Globalizing (WIEGO), lançaram em março o Relatório “O Futuro é Transporte Público” com dados que demonstram que o investimento no setor poderia:

Criar 4.6 milhões de novos empregos até 2030 nas 97 cidades C40, com efeitos multiplicadores positivos adicionais como resultado do maior acesso da população ao transporte público;

  • Reduzir a poluição do ar decorrente do transporte em até 45% em determinadas cidades;
  • Diminuir emissões de gases de efeito do transporte urbano em mais de 50% até 2030, conforme requerido para atingir as metas do Acordo de Paris, e manter o aumento da temperatura global abaixo de 1.5°C. O fracasso em apoiar o transporte público inviabilizaria a possibilidade de reduções do setor de transporte nas cidades e, consequentemente, também inviabilizaria a meta de neutralidade de carbono já que o transporte é o setor mais emissor em cidades latino-americanas;
  • Garantir acesso e segurança a dezenas de milhões de trabalhadores essenciais que dependem do setor para obter sua renda, incluindo equipes médicas, trabalhadores do varejo e outros setores críticos;
  • Conectar habitantes das cidades a oportunidades de trabalho e de educação, atividades de lazer e também uns aos outros, função vital para criar, recriar e fortalecer comunidades mais iguais, vibrantes e prósperas.

O sistema de transporte público é crucial para o sucesso de qualquer estratégia de recuperação econômica, ambiental e social da atual crise. Uma das principais lições da pandemia é a importância de se investir em serviços públicos robustos de qualidade, incluindo a infraestrutura de transporte público, fundamental para se garantir um futuro justo, próspero e sustentável para todos.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities 

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