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MULHERES E O ACESSO À CIDADE

Thais Zschieschang
Thais Zschieschang
Internacionalista, cientista política, mestra e doutoranda em Psicologia Social (PUC/SP). Especialista em inovação pública e socioambiental, cofundadora do Delibera Brasil e pesquisadora pela PUC/SP. Criadora do Manual Participativo e do Jogo do Desenvolvimento Sustentável, autora do Mulheres e Política no Brasil, integrante Conexão Inovação Pública e Coalition for Digital Environmental Sustainability - CODES (PNUMA e PNUD). Mentora ABStartups, BrazilLAB, SEBRAE e Social.LAB.

Na cidade, o acesso ao transporte e o direito à mobilidade devem ser assegurados às mulheres e para todas e todos, independente de seu recorte perfil 

Quando falamos no acesso das mulheres à cidade, não é segredo que a mobilidade tem um papel relevante, senão primordial, de possibilitar a experimentação de tudo que as diferentes regiões podem ofertar.

Pensando nessas ofertas existem os grandes centros urbanos que tendem a consolidar em seus espaços diferentes plataformas, sejam elas mercadológicas,  representando o acesso à empregabilidade e a renda; governamentais, enquanto aparelhos do Estado de mecanismos cuidados e atendimento, seguridade social ou participativos  de regência coletiva das normas de funcionamento societárias; assim como sociais, culturais e domésticas, relativas à melhor qualidade de vida pela experimentação de tais acessos.



Renda e desigualdade

Outra lógica inerente é o custo de acesso e de necessidades especiais de mobilidade,  ou seja, para estar em um ambiente coletivo, se ele não é de sua área de entorno é necessário um valor alocado para tal transporte; e se faz parte de sua área de uso contínuo, existem os custos de permanência na região de interesse. Sendo assim, podemos considerar que a desigualdade do acesso à renda está altamente atrelada com o uso e ocupação de espaços.

Em segundo lugar, a própria acessibilidade aos mecanismos de mobilidade constituem um desafio: é necessário empregar a lógica de visão do usuário referente aos tipos de  serviços de mobilidade disponíveis, sejam eles públicos ou privados. 

Para que demandas e desafios de cada perfil se tornem visíveis, como em casos de mobilidade reduzida de usuários, por exemplo, podendo ser somados à desigualdade social e subjugação de perfis dentro da nossa hierarquização coletiva. Enquanto questões de racismo estrutural, LGBTQAI+fobia, capacitismo e até mesmo acesso ao capital cultural, aqui representado pela educação formal e exemplificado com questões como o analfabetismo, dentro da necessidade de se localizar em uma comunicação tradicional majoritariamente escrita. 

Violência de gênero

Existem mulheres que têm que lidar com questões anexas de tais desigualdade, para além da violência de gênero, como as citadas acima, e isso deve ser levado em consideração: dentro da lógica de desigualdade de gênero, as vulnerabilidades múltiplas se sobrepõem em um contexto em que as rotinas e os padrões de deslocamento são condicionados, por medo e pela cultura do resguardo, que orienta a preservação a partir da privação, sendo um mecanismo de exclusão de mulheres da vida pública. 

É inegável o aumento da participação de mulheres na esfera pública, alcançamos melhores acessos ao mercado de trabalho e à educação formal, direitos de uso de serviços essenciais do Estado e somos a maioria populacional. Em critérios de resguardo programado pela produção cultural que definia o espaço da mulher enquanto limitado ao ambiente doméstico, vivemos constantes ressignificações, e com isso, maior acesso à ambiente de trânsito e convivência, tornando a mobilidade questão essencial para mulheres, com seus respectivos desafios, como a objetificação de corpos e violências de gênero, simbólicas, físicas e sexuais.

Para compreender como esses abusos são experimentados e necessária a compreensão da multiplicidade de perfil de mulheres e seu uso aplicado para cada trânsito empregado, sendo que estas são as reais e profundas conhecedoras das situações experimentadas, assim como idealizadoras das melhores soluções possíveis de integração para superação dos próprios problemas vividos. Com isso chegamos em uma demanda relevante: o desenvolvimento de mecanismos de escuta qualificada e real participação. 

Além da necessidade de conhecimento dos problemas e potenciais soluções, relacionadas diretamente a mecanismos participativos, se faz necessária a equidade representativa de gênero e perfis dentro de espaços de desenvolvimento e de gestão das soluções previstas, sejam elas públicas e privadas.

Soluções integradas

Considerando que a agenda é multifacetada, demandando soluções integradas, em áreas como iluminação, monitoramento e segurança pública de vias; desenvolvimento local, com pontos de empregabilidade, acesso a aparelhos de saúde, cultura e educação; e pastas identitárias, como de pessoa com deficiência, LGBTQAI+, de mulheres e afins.

Para além disso, se fazem necessários espaços de trocas sobre as violências experimentadas, como estratégia de não normalização de abusos sofridos; e de não culpabilização de vítimas pelas situações vivenciadas.

A corresponsabilização de todas e todos pelo enfrentamento à desigualdade e violência de gênero, principalmente quando as presenciarem, é pasta complementar de essencial relevância para o enfrentamento da aceitação culturas de tais crimes, envolvendo demais usuários dos serviços e produtos ofertados, funcionários e até mesmo transeuntes.

O objetivo final é o de encaminhamento legal dos abusadores e proteção das vítimas em questão, colocando abusadores em um local de contraponto em sua consciência para que possam cada vez mais entender que tais atitudes não serão aceitas e suas as consequências, de forma inibitória.

Solução temporária

Graças aos desafios de mobilidade correspondentes à desigualdade de gênero, novas soluções foram geradas, sendo elas desde de reserva de espaço ou atendimento exclusivo para mulheres, ou até mesmo de sistema de denúncias, mapeamento de áreas de risco e incidentes. Vale ressaltar que uma das lógicas de desenvolvimento é segregação de produtos e serviços ofertados,  esta deve ser tratada como uma solução temporária, pois ataca apenas um dos efeitos dessa produção cultural excludente. 

O acesso ao transporte e o direito à mobilidade devem ser assegurados para todas e todos, independente de seu recorte perfil, e para isso é necessário criar ambientes seguros e acessíveis. Para alcançar esse objetivo é necessária a criação de espaços de escuta integrativa para todas e todos segundo suas próprias perspectivas de acesso à mobilidade em suas diferentes modalidades, promovendo a dissolução dos custos impeditivos de participação social, fomentando a possibilidade de acesso a essa instrumentações e à própria cidade enquanto o conteúdo macro e micro local.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities 

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