De acordo com o índice desenvolvido pela pesquisa, mais de metade dos municípios brasileiros (cerca de 54,1%) têm capacidade de adaptação inferior ao ideal
O extremo entre inundações e secas severas que se vê no norte e no sul do Brasil é só uma das faces mais evidentes da crise climática que tem afetado de maneira crescente o território nacional.
Um estudo inédito realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em colaboração com instituições brasileiras e internacionais, identifica quais cidades estão mais e menos preparadas para lidar com os desafios impostos pelas mudanças no clima, que afetam a organização urbana e requerem adaptações de infraestrutura, planejamento e distribuição de recursos.
O fruto do estudo é o Urban Adaptation Index (UAI), um índice que mede a adaptação urbana dos 5.569 municípios brasileiros (além do Distrito Federal), de acordo com a capacidade institucional diante dos impactos das mudanças climáticas. O índice cruza dados com a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic), desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes aos anos de 2020 e 2021.
De acordo com o índice, mais de metade dos municípios brasileiros (cerca de 54,1%) têm capacidade de adaptação inferior ao ideal.
O UAI atribui uma pontuação que vai de 0 (muito baixa capacidade) a 1 (capacidade alta), levando em consideração as adaptações necessárias para combater os efeitos nocivos das alterações ambientais. Eles podem incluir, por exemplo, planos de moradia e ocupação do solo, redução de riscos e políticas para a mobilidade urbana, garantia da segurança alimentar e gestão ambiental equilibrada.
O índice é uma ferramenta estratégica para apoiar gestores na formulação de políticas públicas e climáticas integradas, com base em dados “concretos e comparáveis”, diz o estudo.
Capitais brasileiras e desigualdade
Apesar de concentrarem mais recursos e capacidade de infraestrutura, as capitais brasileiras tiveram grandes diferenças na capacidade adaptativa registrada entre regiões — enquanto cidades como Curitiba, Belo Horizonte e Brasília lideram o ranking, com índices de 0,98 e 0,95, respectivamente, capitais do Nordeste, como Recife, pontuam mal. A capital de Pernambuco ficou com média 0,46 (foi a capital com a pior avaliação), seguida por Aracaju (SE) e Boa Vista (RO), ambas com 0,54. Já São Paulo, a maior capital do país, pontuou 0,89.
O levantamento também mostra que os municípios com até 50 mil habitantes — que são a maioria no Brasil — têm, em média, índices que vão de 0,33 a 0,44, e caracterizam uma baixa capacidade institucional para lidar com desastres climáticos. Mais de quatro mil municípios são marcados pela carência de equipes técnicas, orçamentos limitados e pouca integração com políticas estaduais ou federais, diz o levantamento.
- Curitiba: 0,98
- Belo Horizonte: 0,98
- Brasília: 0,95
- São Paulo: 0,89
- Porto Alegre: 0,85
- Manaus: 0,70
- Natal: 0,57
- Aracaju e Boa Vista: 0,54
- Recife: 0,46
“Apenas 13% das cidades afirmaram possuir planos municipais de redução de riscos em 2020, e somente 5,5% contavam com cartas geotécnicas”, destaca a pesquisadora Gabriela Di Giulio, uma das autoras do estudo, ao Jornal USP. As cartas geotécnicas são documentos que detalham as características do solo e auxiliam no planejamento urbano e na prevenção de riscos geológicos (como a suscetibilidade a desastres naturais, inundações e deslizamentos).
Em 2024, destaca a pesquisadora, o Brasil passou por episódios de inundação que deslocaram mais de 615 mil pessoas, especialmente entre as populações de baixa renda.
Fonte: Revista Forum
