Se não quisermos ficar para trás em comparação com outros países como a China, a expansão do 5G e, em breve, do 5.5G é essencial
O conceito de cidades inteligentes surgiu como forma de discutir a importância da adoção das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) na administração pública. Ao longo dos anos, foi possível assistir à criação de um ecossistema robusto relacionado ao tema e de inúmeros projetos que têm gerado impactos positivos na qualidade dos serviços e na infraestrutura urbana no Brasil¹ e no mundo. Multiplicam-se iniciativas e instituições, como o Portal Connected Smart Cities, que são exemplos da relevância e da maturidade que a iniciativa alcançou.
Agora, a chegada da inteligência artificial (IA) na gestão pública deve elevar ainda mais o conceito de cidades inteligentes e promover mudanças até pouco tempo inimagináveis. Sua adoção por prefeituras e órgãos públicos abre novas possibilidades para o planejamento urbano, a prestação de serviços e o atendimento às demandas da população de maneira mais ágil, customizada e com custos mais baixos, eliminando burocracias desnecessárias e obsoletas.
A capacidade de extrair inteligência de enormes quantidades de dados é o segredo das soluções de IA. Sua função é gerar eficiência, permitindo que orçamentos reduzidos sejam usados de forma adequada e criando uma uma nova maneira de tomar decisões. A quarta revolução industrial está em pleno curso, com a inteligência artificial tornando-se a força transformadora. A próxima década será de consolidação desse cenário, no entanto, para isso acontecer, é necessário se preparar.
Desafios na adoção da IA na administração pública
O desenvolvimento de inteligência artificial depende de alguns fatores importantes. Um deles está relacionado ao avanço das redes de banda larga 5G. Aqui, cabe reconhecer que o Brasil está fazendo a sua parte. Em apenas dois anos e meio, o país construiu a maior rede 5G da América Latina, com mais de 96 mil antenas cobrindo 538 cidades. No entanto, esse número também revela que apenas 10% dos municípios brasileiros deram esse passo essencial para a adoção da IA.
Se não quisermos ficar para trás em comparação com outros países como a China, a expansão do 5G e, em breve, do 5.5G é essencial. Os novos prefeitos recém-eleitos precisam saber que as novas redes móveis não estão restritas às empresas ou aos indivíduos. Imagine o que cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro podem fazer com fluxos de dados inteligentes em setores como educação, saúde, mobilidade urbana, turismo e segurança pública?
Outro fator importante é um conjunto de datacenters e de armazenamento de alto desempenho e segurança, capaz de lidar com dados na era dos petabytes. Uma infraestrutura de datacenters, aliada às aplicações de inteligência artificial no setor público, é o segredo de uma transformação digital bem sucedida. Esse é o divisor de águas entre um cenário em que a produtividade e a eficiência estavam escondidas em meio à complexidade de dados inacessíveis em sistemas lentos e um no qual as decisões são baseadas em conhecimento gerado pelo aprendizado da máquina.
Outro fator desafiador é a falta de mão de obra qualificada no setor de TIC. O mercado já demanda um número muito maior de profissionais do que as universidades e as instituições técnicas conseguem formar, o que impacta enormemente no desenvolvimento da IA. Por isso, é dever da administração pública gerar oportunidades de capacitação. A força de trabalho brasileira tem hoje cerca de 170 milhões de pessoas em idade produtiva. É uma pena notar que milhões desses indivíduos estão em subempregos ou em ocupações que em breve serão facilmente realizadas por máquinas autônomas.
O uso da IA no serviço público
Na saúde pública, a inteligência artificial pode ser empregada para otimizar o atendimento ao cidadão. Ferramentas que utilizam IA podem, por exemplo, prever surtos de doenças ao analisar padrões de dados históricos e de comportamento. Além disso, sistemas de diagnóstico auxiliados por essa tecnologia têm o potencial de acelerar a triagem em unidades de saúde, ajudando a desafogar emergências e a garantir que o atendimento seja oferecido para quem realmente precisa com maior urgência. A análise de grandes volumes de dados médicos também permite a criação de programas de saúde preventiva personalizados para diferentes grupos da população, tornando o atendimento mais proativo e menos reativo, além da economia de recursos escassos.
Na área da educação, a IA pode ser usada para monitorar o desempenho de alunos, identificando dificuldades de aprendizagem e auxiliando professores no planejamento de estratégias educacionais. Em redes de ensino municipais, a inteligência artificial pode gerar relatórios com dados detalhados, permitindo que as escolas e os professores personalizem o ensino e intervenham de maneira mais precisa para garantir a evolução de cada aluno. Programas baseados em IA também podem ser usados para capacitação de professores e para facilitar o acesso dos alunos a conteúdos de alta qualidade, contribuindo para a formação de estudantes mais preparados para o mercado de trabalho.
Em termos de mobilidade urbana, as possibilidades vão desde a automação do transporte público até o monitoramento e otimização de tráfego em tempo real. A implementação de IA na administração do transporte coletivo ajuda a prever congestionamentos, ajustar horários de ônibus de acordo com a demanda e melhorar a segurança dos usuários. Além disso, a introdução de veículos autônomos representa um futuro em que o transporte será mais acessível e seguro para todos. Embora os carros autônomos ainda representem um desafio de infraestrutura e regulação, sua integração pode melhorar a conectividade urbana, facilitando o deslocamento em áreas onde o transporte público tradicional é limitado.
Na administração pública, a IA é uma aliada para melhorar a eficiência na gestão de recursos e na tomada de decisões. Chatbots e aplicativos inteligentes, por exemplo, são úteis para agilizar o atendimento ao cidadão, respondendo a perguntas e resolvendo problemas de maneira mais rápida. Ferramentas de análise de dados ajudam a prever a demanda por serviços, permitindo que os gestores façam planejamentos mais precisos e eficazes. Além disso, a IA pode ajudar a identificar fraudes e irregularidades, aumentando a transparência e a confiabilidade na gestão pública.
Próximos passos
Em Shenzhen², cidade de 20 milhões de habitantes no noroeste da China, veículos autônomos garantem a limpeza de ruas e parques. No metrô de Pequim, tecnologia de reconhecimento facial permite que os passageiros embarquem nos trens sem passar um cartão ou escanear o telefone, abrindo as catracas com uma rápida varredura do rosto que dura menos de dois segundos. Shanghai conta com uma Plataforma de Serviços de Computação Pública de Inteligência Artificial, que fornece recursos de computação em nuvem para empresas e organizações promoverem a inovação e a digitalização da cidade.
Veículos com condução autônoma já estão disponíveis, e estima-se que até 2030 cerca de 80 milhões de novos veículos conectados entrem no mercado anualmente, sendo 40% deles equipados com sistemas de condução assistida. Na China, os táxis autônomos já operam em 12 cidades, incluindo Pequim e Shanghai, realizando mais de 6 milhões de viagens com segurança, totalizando mais de 100 milhões de quilômetros sem incidentes graves.
O próximo período promete uma expansão ainda maior das soluções de IA no setor público chinês, impulsionada pelas enormes oportunidades que a tecnologia oferece. No Brasil, os prefeitos terão a séria tarefa de pensar a administração de seus municípios com uma ambição totalmente nova. Com a inteligência artificial, o setor público tem a oportunidade de evoluir para um modelo de serviço centrado no cidadão, utilizando tecnologia para construir uma experiência de morar, produzir, estudar, trabalhar e viver que seja mais inclusiva, mais próspera e mais feliz.
¹ A Conexis divulga um ranking de Cidades Inteligentes brasileiras neste link. ² Detalhes sobre essas iniciativas chinesas estão neste link.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities.
Vice-Presidente de Relações Públicas da Huawei na América Latina e Caribe, com contribuição significativa na construção de parcerias que alavancam a transformação digital no Brasil. O executivo já atuou como gestor de Rede e Data Center da Prodam – SP, passando por multinacionais como Cabletron, Enterasys e CISCO, onde foi responsável pela área de Diretorias Regionais de Vendas.