A promessa, com a aprovação da Nova Lei do Saneamento de 2020, era uma avalanche de leilões para concessões e PPPs (Parcerias Público-Privadas) no setor, que viriam no embalo de três projetos que já vinham sendo estruturados antes dela, tiveram disputas bem sucedidas e de elevado interesse, os de Alagoas, Amapá e Rio de Janeiro.
Mas a realidade foi bem diferente, com um avanço pequeno nos últimos três anos das parcerias para que se possa evoluir com o mais atrasado setor de infraestrutura no país.
Após longa disputa entre empresas públicas e privadas, 2024 deve ser o ano da retomada das parcerias no setor, avalia o secretário especial do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) da Casa Civil da Presidência, Marcus Cavalcanti.
“Era uma briga que, na verdade, ninguém ia ser capaz de fazer sozinho. [Acreditamos que] agora o privado terá a segurança jurídica para investir”, disse o secretário à Agência iNFRA.
O leilão a abrir a fila deve ser o do estado de Sergipe, que está em fase final de estruturação e, de acordo com o monitoramento do PPI, está com os acordos com os municípios adiantados. A expectativa é de investimentos na casa dos R$ 6 bilhões.
A previsão é de que ocorra ainda neste ano e o modelo será semelhante ao utilizado no Rio de Janeiro e em Alagoas, com a concessionária contratada ficando responsável por distribuição de água, e coleta e tratamento de esgoto, e a estatal estadual se mantendo na entrega da água.
Esse modelo também está previsto para ser usado em Rondônia, onde os acordos estão mais atrasados e não devem ser fechados a tempo de um leilão para este ano devido ao ciclo eleitoral. Como nos outros dois estados, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) também estuda o modelo para ser realizado no Pará. Em Pernambuco, Rio Grande do Norte, Goiás e Paraíba, todos em estudos, a tendência é um modelo de PPP com as estatais.
Limites da lei de 2020
A disputa sobre os limites da lei de 2020 em relação às estatais estaduais de saneamento tinha feito com que as parcerias andassem lentamente após o primeiro ciclo. Projetos de PPP convocados por essas estatais no Ceará, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul foram realizados. E 30 municípios fizeram individualmente concessão ou PPP.
Mas, no total, esses projetos não alcançam 5% da população do país, enquanto as três grandes concessões iniciais (RJ, AL e AP) atingiam quase 18% da população, de acordo com dados da Abcon/Sindicon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto).
Agora, consideradas as 44 concessões e projetos de PPPs que estão sendo estruturados por governos e companhias estaduais ou individualmente por municípios mapeadas pela associação, seriam impactados 32% da população nacional, com expectativa de investimentos na casa dos R$ 110 bilhões.
Velocidade dos investimentos
A velocidade para fazer os investimentos é considerada fator primordial para que os projetos de saneamento sejam realizados, visto que a lei determina o atingimento de um percentual de 90% de coleta e tratamento de esgoto e 99% de fornecimento de água para todo o país até 2033.
Os números variam, mas o volume de investimentos por ano para atingir a meta é estimado na casa dos R$ 70 bilhões, mais que o dobro da média do que se vem investindo nos últimos anos. Por isso, o secretário do PPI, Marcus Cavalcanti, alerta para a necessidade de todo tipo de parceria, apostando que nem o setor privado seria capaz de responder sozinho à demanda.
E para o secretário, os decretos publicados pelo governo em julho do ano passado, alterando a regulamentação anterior da lei, trouxeram a segurança necessária para a retomada dos investimentos.
“Vamos para o jogo”
Percy Soares Neto, que dirige a Abcon/Sindicon, acredita que o ciclo de novos leilões será “robusto”, o que será positivo para o setor. Para ele, era natural que numa transição do governo, qualquer que fosse, se levasse a um período de suspensão.
Mas, para Percy, a definição sobre os novos limites para os formatos de parcerias e o fato de os primeiros projetos licitados em 2020 estarem sendo bem sucedidos estão dando força para a retomada.
“Está dada a regra, vamos para o jogo. Houve uma maior abertura para as empresas públicas, mas isso não se questiona mais. Agora é ir para frente e colocar projeto no mercado. O que tem que ter é leilão”, disse Percy.
Resíduos sólidos
Outra parte do saneamento para a qual o PPI também acredita em grandes avanços a partir deste ano é o setor de resíduos sólidos (destinação final). São pelo menos 13 projetos em estruturação, com elevadas chances de três deles serem licitados em 2024.
São eles: o Consórcio CMM (São Paulo, liderado pela cidade de Ribeirão Preto), o Consórcio Cias (Minas Gerais, liderado pela cidade de Divinópolis), e o Consórcio Cirsop (São Paulo, liderado pela cidade de Presidente Prudente).
Além dos projetos em estruturação, o PPI também deverá aportar recursos para novos estudos em projetos desse tipo que haviam sido solicitados via chamamento do FEP Caixa, mas que não foram feitos por falta de recursos nesse fundo. A ideia é usar recursos de outro fundo, o Fdirs, para esses pedidos, conforme mostrou a Agência iNFRA.
Os projetos estão alicerçados na nova permissão de cobrança de tarifa pelo serviço de coleta e destinação de lixo, aprovada na lei do saneamento de 2020. Assim, de acordo com o secretário adjunto do PPI, Manoel Renato Machado Filho, estão sendo estruturados para serem concessões.
Resistência a colocar na conta de água
Segundo ele, o maior desafio dessas parcerias é a resistência das empresas de saneamento em colocar na fatura de água e esgoto a taxa que foi criada para os resíduos, alegando que isso poderia aumentar a inadimplência geral dos projetos. Segundo ele, os números não apontam para esse efeito.
“Há um período inicial de três meses em que isso ocorre, mas depois a inadimplência volta ao mesmo patamar”, explicou Manoel Renato.
De acordo com o secretário, alguns projetos estão sendo estruturados para gerar um boleto autônomo ao da conta de água, como forma de teste, mas ele acredita que isso deverá gerar uma inadimplência maior da taxa específica, o que pode dificultar projetos em regiões com menor volume de comércio, por exemplo.
Produção de energia é caro
Manoel Renato também explicou que os projetos de tratamento de resíduos estão sendo estruturados com a possibilidade de os concessionários obterem como receita acessória a geração de energia.
Segundo ele, no atual modelo e com os valores elevados dos equipamentos para se gerar energia com o lixo (para a produção com queima, seriam 60 milhões de euros só para o incinerador), colocar o item como obrigatório levaria a aumentos de capex que poderiam inviabilizar várias propostas.
O secretário do PPI, Marcus Cavalcanti, também diz que não há espaço para que se coloquem subsídios na conta de energia para tornar competitiva a geração por meio de resíduos.
Fonte: Agência Infra