Com uma gestão inteligente e orientada por dados, aliada a avanços no processo de eletrificação da frota, será possível acelerar de maneira mais contundente a transição para um cenário de emissões zero do transporte público
Atender ao anseio da população por deslocamentos mais ágeis, acessíveis e seguros e, ao mesmo tempo, diminuir as emissões de gases do efeito estufa (GEE) por parte do sistema estão entre os desafios prioritários a serem enfrentados pelos agentes públicos e privados que atuam no transporte urbano.
Segundo dados da Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU), 28% dos brasileiros usam o transporte público. Com isso, são 2.703 municípios atendidos por serviços de empresas do setor e uma frota nacional de cerca de 107 mil coletivos. Os números deixam ainda mais evidente a necessidade de tornar o serviço mais eficiente, acelerar a transição energética das frotas e otimizar recursos e investimentos.
A transformação digital do transporte público é uma tendência que deve ganhar ainda mais força a partir deste ano. Ferramentas inovadoras e disruptivas, geradas a partir de arquiteturas de sensores inteligentes (IoT), processamento de dados distribuído (edge computing), bandas de 5G de alta performance e geoposicionamento via satélite têm sido utilizadas para resolver a equação da mobilidade urbana.
Sistemas de transporte inteligentes, criados para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, apoiados por políticas públicas orientadas por dados, melhoram diversas questões. Entre elas, a saúde, a economia, a segurança das cidades e, ainda, o meio ambiente. Todos esses fatores só têm uma peça-chave para conseguirem avançar: a inteligência de dados.
Matriz energética e descarbonização
A descarbonização do transporte público é uma agenda prioritária do setor para os próximos anos. De acordo com levantamento do Banco Mundial, o transporte de passageiros por via terrestre (carros, motocicletas e ônibus) representa 60% das emissões de gases do efeito estufa associadas ao transporte rodoviário, que é responsável por 11,9% de todo o volume de poluentes emitidos pelo setor de Transporte.
Para se ter uma ideia do quanto isso equivale dentro do volume global de gases produzido na atmosfera, Transporte representa 16,2% das emissões do espectro da Energia, que, por sua vez, corresponde a 73,2% das emissões em todo o globo. Entretanto, em áreas urbanas, a participação da categoria no total de emissões é muito maior: no estado de São Paulo, por exemplo, o setor de transportes representa quase 30% das emissões [dados do PAC2050].
Por isso, a mudança da matriz energética, de combustíveis fósseis para energia de fontes renováveis, é encarada como fundamental para a consolidação da economia de baixo carbono em todo o mundo, para o cumprimento das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) assumidas pelos países na Conferência do Clima das Nações Unidas, firmadas em 2015, e para a criação de cidades mais sustentáveis.
Em média, um ônibus a diesel convencional consome 90 litros de combustível por dia, gerando cerca de 120 toneladas de dióxido de carbono por ano – o equivalente ao plantio de 847 árvores por veículo.
Ônibus movidos a eletricidade ou biocombustível são as alternativas mais desenvolvidas e viáveis. No caso da eletrificação, a cidade de Santiago, no Chile, possui a maior frota de ônibus elétricos da América do Sul, com 1.000 veículos. A meta é dobrar de tamanho até o final de 2023 e atingir a eletromobilidade total em 2035. Com isso, o governo local espera reduzir em 35% as emissões de CO2 na cidade.
Este pode ser um bom exemplo para as cidades brasileiras, que ainda têm um longo caminho pela frente. No país, o exemplo mais avançado é o da cidade de São Paulo, com o modesto percentual de 1,6% de frota elétrica dentro do seu total de 14,5 mil ônibus, até outubro do ano passado.
Inteligência de dados
Tanto a transição da fonte de energia quanto a diminuição das emissões de poluentes são fatores que podem ser acelerados a partir do uso da tecnologia. O papel da inteligência de dados na transição energética das frotas de ônibus é fornecer uma análise criteriosa sobre as características das linhas, do tráfego local e topografia de cada rota, na intenção de determinar qual linha terá mais aderência ao modal eletrificado. Além disso, contribuir para dar maior transparência ao processo de mudança de matriz, com informações claras à população sobre os benefícios e vantagens dessa medida.
Com uma gestão inteligente e orientada por dados, aliada a avanços no processo de eletrificação da frota, será possível acelerar de maneira mais contundente a transição para um cenário de emissões zero do transporte público. Um objetivo a ser perseguido, primordial para a mitigação do impacto do aquecimento global na vida dos habitantes das áreas urbanas, e que também beneficia a saúde de toda a população, sejam passageiros do transporte público ou não.
Observando o futuro, as cidades que buscarem solucionar desde já os desafios de mobilidade, potencializando o transporte público, estarão mais bem preparadas, com suas economias mais resilientes e sustentáveis, para enfrentar as disrupções que estão por vir.
*Roberto Speicys é CEO e cofundador da Scipopulis, empresa green4T