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EQUIDADE DE GÊNERO NA MOBILIDADE URBANA

Jens Giersdorf
Jens Giersdorf
Com mais de 14 anos de experiência no setor de energia para o desenvolvimento sustentável exerce atualmente o cargo de Management Head da Transformative Urban Mobility Initiative (TUMI) pela Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ).

Para fazer a transição justa para a economia de baixo carbono precisamos de sistemas de transporte feministas

O transporte público é um direito essencial, que viabiliza o acesso a outros direitos como saúde, educação, trabalho, lazer e descanso. As mulheres são a maioria entre as pessoas que utilizam o transporte público no Brasil, mas a minoria entre as pessoas que trabalham no setor de transportes, este que oferece uma ampla gama de oportunidades de emprego. Ciente da importância da pauta de gênero, o governo alemão se comprometeu com uma Política de Desenvolvimento Feminista, o que se reflete nos diferentes segmentos e projetos que implementa no mundo e no Brasil.

Buscando por equidade na representação feminina em espaços de tomada de decisão sobre as políticas públicas, a GIZ lançou no Brasil no ano passado a Rede de Lideranças Femininas Urbanas, cujo objetivo é fortalecer a gestão pública feita por mulheres por meio de encontros, networking, palestras e capacitações. Para que as mulheres se sintam acolhidas, reconhecidas e valorizadas, foram criados espaços para trocas, acolhimento, aprendizagem mútua e crescimento entre prefeitas, secretárias e líderes de equipes técnicas.

Neste ano de 2023, também a Iniciativa Transformadora de Mobilidade Urbana (TUMI) terá um foco ainda maior em trabalhar pela equidade de gênero no setor de transportes. Desde sua origem em 2016, a iniciativa TUMI é orientada a priorizar o acesso à mobilidade, em especial às mulheres, às pessoas negras, com mobilidade reduzida e de baixa renda.

Uma de suas principais frentes é a Women Mobilize Women, ação global que tem como objetivo incentivar que as mulheres sejam protagonistas do desenvolvimento das cidades. Como ressalta Eveline Trevisan, coordenadora de Sustentabilidade e Meio Ambiente da BHTrans – eleita uma das Vozes Feministas Notáveis ​​no Transporte em 2023 (premiação no âmbito do Women Mobilize Women) –, as cidades são historicamente planejadas por homens e o primeiro passo para um sistema de transporte feminista é compreender que a maioria das mulheres se desloca de forma muito diferente da maioria dos homens.

Nas palavras de Eveline, as mulheres fazem deslocamentos muito mais diagonais e entrecortados. Algo muito característico do deslocamento feminino é a mobilidade ativa, ou a pé, e precisamos de calçadas mais seguras. Mulheres negras que vivem nas periferias são as mais afetadas negativamente pela forma como as cidades foram construídas no passado. É muito comum que os deslocamentos das mulheres nas cidades sejam moldados pelo medo, lembra Kelly Fernandes, assessora técnica da GIZ pelo programa EUROCLIMA+ – o principal programa de cooperação da União Europeia com a América Latina sobre sustentabilidade e mudanças climáticas -, e ponto focal no tema de diversidade na mobilidade urbana. 

Pessoas do sexo feminino são as maiores vítimas de violência e importunação sexual no transporte público coletivo e ativo. Nos últimos anos, campanhas de algumas cidades, como São Paulo e Fortaleza, para divulgar canais de denúncias nos transportes, fizeram aumentar o registro de ocorrências, encorajando mulheres a denunciar e acuando importunadores. Ruas mais iluminadas, mobiliários urbanos que dificultem que os assediadores se escondam atrás deles, e calçadas em melhor estado são essenciais para tornar a mobilidade nas cidades mais segura para as mulheres. 

Kelly e Eveline também destacam que o deslocamento feminino está muito ligado ao papel de cuidado que culturalmente é atribuído às mulheres. Para além da sobrecarga por causa da não divisão ou divisão desigual do trabalho doméstico e de cuidado da família, elas também são as maiores prejudicadas pelo crescimento do número de veículos em circulação nas vias e consequente aumento do tempo de viagem total. Políticas públicas de transporte com foco na criança devem ser pensadas levando em consideração o impacto desigual no público feminino, porém de forma ainda a superar os estereótipos de gênero no exercício do cuidado familiar. A integração de modais com pagamento de bilhete único é importante para não afetar desigualmente a renda delas. 

Para trilhar uma transição justa é preciso aproveitar a mudança de matriz energética das frotas de ônibus, de diesel para elétrica, para também transformar a forma como as mulheres se deslocam. Analisando as questões de gênero nas pesquisas que antecedem as mudanças, bem como as questões raciais e de renda, com um olhar interseccional entre essas variáveis – e ampliando assim a coleta de dados no Brasil. Os novos empregos que surgem neste processo devem ser ocupados por motoristas mulheres e especialistas em transporte público. 

Ao longo dos últimos meses, a TUMI E-Bus Mission realizou juntamente com nosso parceiro UITP, treinamentos online com foco na diversidade e inclusão no transporte público, onde foram debatidos os benefícios do desenvolvimento de sistemas de transporte público inclusivos. A capacitação enfocou tanto as esferas da operação de transporte público quanto a implantação de projetos de ônibus elétricos, e proporcionou às pessoas participantes um espaço de aprendizado e intercâmbio. Estudos de caso bem-sucedidos e exemplos de boas práticas foram apresentados e as pessoas se envolveram em discussões sobre diversidade e equidade de gênero no setor de transporte. A capacitação foi uma ótima oportunidade para construir estratégias organizacionais em prol da inclusão. Os resultados vão beneficiar a todas as pessoas. 

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities 

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