Do pioneirismo hidrelétrico à mobilidade elétrica: o Brasil na liderança da transição energética
O Brasil tem uma trajetória única no uso de energias limpas para geração de eletricidade. Ao longo de sua história, ao invés da queima de carvão e de outras fontes poluentes, optou pela força de seus rios para construir usinas hidrelétricas que suportaram, durante muito tempo, as necessidades de sua população. Desde sua inauguração, Itaipú, agora com 40 anos, foi reconhecida mundialmente como a maior usina do mundo, mostrando a força da engenharia e a capacidade de inovação da sociedade brasileira.
Em um momento no qual os desafios ambientais estão estimulando a transição energética em larga escala, essa opção pela energia limpa coloca o país em vantagem. Mais de 80% da eletricidade gerada no país vem de fontes renováveis, contra pouco mais de 25% da média global. As hidrelétricas respondem pela maior parte dessa matriz, mas, nos últimos anos, houve um crescimento expressivo das fontes solar e eólica, diversificando a base energética nacional. Além dos rios, o Brasil também tem uma posição geográfica privilegiada em relação aos ventos e à incidência da luz do sol.
Esse potencial e a experiência acumulada mostram que o país tem capacidade de integrar diferentes soluções e de aproveitar seus recursos naturais e sua infraestrutura existente. Trata-se de uma posição estratégica com excelente potencial de contribuir com o desenvolvimento, em um momento em que a transição energética se tornou prioridade e, ao mesmo tempo, um diferencial competitivo em todo o mundo.
Esse diferencial começa a tomar forma nos diferentes projetos de transformação energética e digital que surgem pelo país. Recentemente, a Prefeitura de São Paulo deu um passo importante ao anunciar um programa de mobilidade elétrica que visa substituir sua imensa frota de ônibus movida a combustíveis fósseis. O projeto reforça a posição da cidade como referência em políticas de descarbonização e mostra que há condições para expandir esse movimento, alcançando mais municípios e beneficiando milhões de pessoas.
A transição energética no transporte é o processo de substituição de combustíveis fósseis por fontes de energia mais limpas, em consonância com as diretrizes globais de descarbonização e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Mas eletrificar frotas em larga escala não é apenas uma questão de substituir motores a combustão por baterias. Envolve uma transformação estrutural que requer planejamento urbano, integração com a matriz elétrica e investimentos robustos em infraestrutura.
Por isso, Sistemas de Armazenamento de Energia em Baterias (BESS, na sigla em inglês), integrados a carregadores ultrarrápidos e redes inteligentes, são parte fundamental dessa equação. Esse modelo permite superar gargalos técnicos e energéticos, como a necessidade de grandes obras de adequação da rede da concessionária de energia. Uma única unidade BESS, por exemplo, pode multiplicar em até seis vezes a capacidade de recarga de uma garagem.
Essas soluções, já testadas em metrópoles globais como Shenzhen, na China, conhecida por sua frota de ônibus 100% elétrica, são plenamente adaptáveis à realidade brasileira. A inteligência artificial, embarcada nessas tecnologias, permite a gestão da distribuição de energia, a programação de carregamento e a manutenção preditiva das baterias, além de monitorar a frota como um todo, maximizar a eficiência, prolongar a vida útil dos equipamentos e racionalizar a operação pela cidade.
Para além da sustentabilidade, a mobilidade elétrica é um fator de competitividade econômica. Cidades que investem em infraestrutura inteligente e verde se tornam mais atrativas para investimentos e aumentam sua produtividade ao reduzir o tempo gasto em congestionamentos e melhorar a logística. A competição saudável entre as cidades do mundo, pautada pela inovação e eficiência, fomenta a eletrificação e digitalização do transporte coletivo.
Nesse contexto, a adoção da nova mobilidade elétrica está intimamente ligada a decisões políticas, visão estratégica, planejamento de longo prazo e coordenação intersetorial entre órgãos públicos. Algumas ações práticas podem incluir a integração da eletrificação da frota e da infraestrutura de recarga nos planos diretores; a criação de mecanismos de incentivo, como isenções fiscais ou subsídios, para facilitar a transição das frotas e o estabelecimento de parcerias público-privadas que compartilhem investimentos e riscos.
O Brasil, que já demonstrou ao mundo sua capacidade de inovar em energia limpa, tem agora a oportunidade de liderar a transformação da mobilidade elétrica entre as cidades latino-americanas. Para isso, será fundamental fortalecer parcerias entre governos, empresas de tecnologia e operadores de transporte, criando modelos sustentáveis que possam ser replicados em diferentes regiões. O momento é de agir. Ao adotar soluções de ponta em armazenamento, carregamento e digitalização, nossas cidades poderão oferecer transporte público mais limpo, eficiente e conectado — um legado tão transformador quanto o das hidrelétricas que marcam a história energética brasileira.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities.

Vice-Presidente de Relações Públicas da Huawei na América Latina e Caribe, com contribuição significativa na construção de parcerias que alavancam a transformação digital no Brasil. O executivo já atuou como gestor de Rede e Data Center da Prodam – SP, passando por multinacionais como Cabletron, Enterasys e CISCO, onde foi responsável pela área de Diretorias Regionais de Vendas.