Relatório do MapBiomas indica que o impacto do fogo em 2024 superou média histórica em 62%
Um quarto (24%) do território nacional queimou pelo menos uma vez em 39 anos — entre 1985 e 2024 —, um espaço equivalente à soma das áreas do Pará e do Mato Grosso, segundo levantamento do MapBiomas. Foram 206 milhões de hectares afetados pelo fogo com intensidades diferentes em cada um dos seis biomas do país. Ao lado da Amazônia, que bateu recorde de incêndios florestais no ano passado, e da Mata Atlântica, cuja área foi a mais afetada nestas quatro décadas, o Pantanal é destaque: mais da metade (62%) do território foi impactado no período.
Obtido por meio de imagens de satélite, os dados mostram também um retrato do fogo em 2024, quando 30 milhões de hectares foram afetados. A área é 62% acima da média histórica de 18,5 milhões de hectares por ano. A concentração dos incêndios ocorreu no período de agosto a outubro (72% da área queimada no país), com setembro respondendo a um terço do que foi impactado no ano passado.
O relatório indica que 64% da área afetada pelo fogo no país queimou mais de uma vez nestas quatro décadas. O Cerrado foi o bioma com mais recorrência: 3,7 milhões de hectares queimaram mais de 16 vezes em 40 anos.
A pesquisa também mostra o tamanho das cicatrizes deixadas pelo fogo no país. Se a média nacional nas quatro décadas aponta que a maior proporção (27%) correspondia a áreas queimadas entre 10 e 250 hectares, no ano passado houve uma inversão: quase um terço (29%) do território impactado pelo fogo foi em megaeventos de fogo com mais de 100 mil hectares afetados. Os dados apontam também que 43% do total da área queimada no Brasil desde 1985 teve sua última ocorrência de fogo nos últimos dez anos (2014 a 2023).
Nas quatro décadas, 69,5% da área queimada no Brasil ocorreu em vegetação nativa (514 milhões de hectares). O percentual foi ainda maior em 2024: foram 72,7% (21,8 milhões de hectares). Houve também uma mudança no tipo de vegetação nativa mais afetada. Historicamente, a liderança era ocupada pela formação savânica, com uma média anual de 6,3 milhões de hectares. No ano passado, predominou a formação florestal, como 7,7 milhões de hectares — valor 287% superior à média histórica.
Os biomas com maior proporção nativa afetada pelo fogo nas quatro décadas foram Caatinga, Cerrado Pampa e Pantanal — todos com mais de 80% da extensão afetada. Já na Amazônia e na Mata Atlântica, o fogo ocorreu principalmente em áreas ocupadas pelo homem (mais de 55%). No caso da Amazônia, pastagens respondem por 53,2% da área queimada do período. Na Mata Atlântica, 28,9% da extensão queimada eram de pastagens e 11,4% de agricultura.
Leia mais: Construção de estradas impacta mangue amazônico
Veja o cenário em cada bioma
Pantanal
- Foi o bioma mais afetado pelo fogo nas últimas quatro décadas, proporcionalmente. A quase totalidade (93%) dos incêndios ocorreu em vegetação nativa, especialmente em formações campestres e campos alagados (71%). As pastagens representaram 4% das áreas atingidas por fogo.
- É no Pantanal que se encontra a maior prevalência de extensões queimadas superiores a 100 mil hectares (19,6%). Áreas com cicatrizes de queimada entre 500 e 10 mil hectares também se destacam (29,5%) e estão distribuídas por diferentes regiões do bioma.
- Em 2024, houve um aumento de 157% da área queimada no Pantanal na comparação com a média histórica.
- Para Eduardo Rosa, coordenador de mapeamento do bioma Pantanal no MapBiomas, a dinâmica do fogo no bioma “se relaciona com a presença da vegetação natural e com os períodos de seca”.
Mata Atlântica
- O ano de 2024 representou um recorde: os 1,2 milhão de hectares afetados pelo fogo ficaram 261% acima da média histórica para o bioma, de 338,4 mil hectares por ano, além de representar a maior extensão de área queimada em um único ano desde 1985.
No ano passado, São Paulo teve quatro dos dez municípios com maior proporção de área queimada no Brasil, todos no entorno do município de Ribeirão Preto, uma região predominantemente agrícola. - Nas quatro décadas, 8,3 milhões de hectares foram queimados pelo menos uma vez, o que corresponde a 7% do bioma nos últimos 40 anos. A maioria (60%) das cicatrizes mapeadas ocorreu em área antrópica, sendo a pastagem a classe com maior ocorrência (3,9 milhões de hectares). As áreas queimadas menores que 250 hectares são predominantes (80,7%). Quase três em cada quatro hectares afetados pelo fogo na Mata Atlântica (72%) entre 1985 e 2024 queimaram somente uma vez nos últimos 40 anos.
- Para a Natalia Crusco, da equipe da Mata Atlântica do MapBiomas, além dos prejuízos ambientais — como a degradação dos serviços ecossistêmicos relacionados ao clima, à água e ao solo —, são evidentes os danos econômicos e, principalmente, os para a saúde e qualidade de vida da população trazidos pelo fogo.
Amazônia
- Em 2024, o bioma registrou a maior área queimada de toda a série histórica e foi, de longe, o bioma que mais queimou no país. Foram aproximadamente 15,6 milhões de hectares queimados, um valor 117% superior à sua média histórica. Essa área correspondeu a 52% de toda área nacional afetada pelo fogo em 2024, tornando a Amazônia como o principal epicentro do fogo no Brasil no ano passado.
- Pela primeira vez na série histórica, a vegetação florestal tornou-se a classe de cobertura e uso da terra mais afetada pelo fogo na Amazônia. Foram 6,7 milhões de hectares de florestas afetados pelo fogo (equivalente a 43% da área queimada no bioma), superando os 5,2 milhões de hectares de pastagem queimados (33,7%). Historicamente, as pastagens sempre haviam sido a classe mais atingida pelo fogo no bioma.
- “A combinação entre vegetação altamente inflamável, baixa umidade e o uso do fogo criou as condições perfeitas para a propagação do mesmo em larga escala, levando a um recorde histórico de área queimada na região” avalia Felipe Martenexen, coordenador de mapeamento do bioma Amazônia do MapBiomas.
Cerrado
- A área queimada, de 10,6 milhões de hectares em 2024 no bioma, equivale a 35% do total queimado no país no ano passado e representa um crescimento de 10% em relação à média histórica de 9,6 milhões de hectares por ano.
- Juntos, Cerrado e Amazônia responderam por 86% da área queimada pelo menos uma vez no Brasil entre 1985 e 2024: foram 89,5 milhões de hectares no Cerrado e 87,5 milhões de hectares na Amazônia.
- Embora a área queimada nos dois biomas seja semelhante, há uma grande diferença em termos proporcionais, já que a área total da Amazônia é quase o dobro do Cerrado. Na Amazônia, a área queimada pelo menos uma vez nos últimos 40 anos corresponde a 21% do bioma; no Cerrado, esse percentual é de 45%.
- Para Vera Arruda, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipan) e coordenadora técnica do MapBiomas Fogo, foi “observado é um aumento expressivo dos incêndios no período de seca, impulsionado principalmente por atividades humanas e agravado pelas mudanças climáticas”.
Caatinga
- A extensão queimada no bioma, de 11,15 milhões de hectares nas quatro décadas, representou 13% da Caatinga. Cerca de 38% da área queimada no bioma foi afetada pelo fogo mais de uma vez ao longo dos últimos 40 anos. A prevalência foi de áreas menores que 250 hectares (53%).
- As formações savânicas são o tipo de vegetação mais afetado pelo fogo (79%) na Caatinga, e representam 95% da vegetação nativa. Em 2024, houve uma redução da área queimada de 16%, com 404 mil hectares queimados a respeito da média histórica de 480 mil hectares.
- Segundo Soltan Galano, da equipe Caatinga do MapBiomas, “a queda observada em 2024, com valores abaixo da média nos últimos 10 anos da série histórica, é positiva, mas não garante uma tendência de redução a longo prazo”.
Pampa
- O bioma tem a menor área queimada, tanto em extensão (495 mil hectares), como proporcionalmente em relação ao total do território (3%). O relatório mostra que, apesar de um leve aumento em relação a 2023, os valores permaneceram abaixo da média anual, de 15,3 mil hectares. O ano com maior área queimada dentro do período analisado foi 2022, com 36,2 mil hectares.
- As áreas queimadas no Pampa são predominantemente pequenas, com cerca de 93% das cicatrizes de fogo atingindo menos de 250 hectares. A maioria dos incêndios (95%) ocorre em áreas naturais, predominando nas formações campestres. A silvicultura foi o tipo de uso antrópico com maior extensão de área queimada (19,6 mil hectares).
- Para Eduardo Vélez, coordenador de mapeamento do bioma Pampa do MapBiomas, “embora o fogo ocorra em menor escala no bioma, muitas áreas naturais estão sujeitas a incêndios catastróficos nos períodos mais secos, como as áreas pantanosas e os campos com grande acúmulo de biomassa, que resultam em danos ambientais expressivos”.
Fonte: O Globo
