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Data Centers no Brasil: Desafios, oportunidades e políticas públicas para um futuro digital

Impulsionando a economia digital: o papel dos data centers e as apostas do Brasil para liderar na América Latina

Os data centers, ou centros de processamento de dados, são instalações físicas que constituem os pilares essenciais da infraestrutura digital contemporânea. Eles abrigam servidores, dispositivos de armazenamento e redes, sendo cruciais para o processamento e armazenamento massivo de dados digitais. Em uma era definida pela Sociedade da Informação e pela economia digital, na qual a informação digital e a internet são centrais, os data centers suportam desde buscas online e transações bancárias até aplicações avançadas em Saúde, Agronegócio, Indústria e Cidades. Com a explosão da demanda impulsionada pela Inteligência Artificial (IA) e a crescente digitalização, a necessidade por infraestrutura de data centers aumenta exponencialmente.

Nesse contexto global, a América Latina emergiu como uma “nova fronteira” para grandes investimentos no setor de data centers, e o Brasil se destaca como um player significativo. 

O Nordeste tem se consolidado como um pólo estratégico para a instalação de data centers, especialmente devido à abundância de energia renovável, como a eólica, e à proximidade de cabos submarinos que garantem alta conectividade. O Ceará lidera esse movimento, com projetos bilionários, incluindo um investimento de R$ 55 bilhões da Casa dos Ventos e negociações do governo estadual com empresas chinesas que podem injetar até R$ 50 bilhões na região. A ByteDance¹ avalia um grande empreendimento no complexo portuário de Pecém, enquanto outras empresas, como V.tal e Angola Cables, também investem na capital cearense. A HostDime planeja construir um novo data center edge TIER IV em João Pessoa².

O Rio de Janeiro recebe destaque com o ambicioso projeto Rio AI City, desenvolvido pela Elea Data Centers na região do Parque Olímpico³, que terá capacidade inicial de 1,5 GW, podendo atingir 3,2 GW. O projeto é apoiado pelo município e busca transformar a região do Parque Olímpico em um hub tecnológico. Há também estudos para levar investimentos ao Porto do Açu.

São Paulo continua sendo o maior centro de data centers do país, atraindo gigantes como Elea, ODATA e Tecto, que estão ampliando suas operações. Entre os projetos de destaque está um investimento de R$ 5 bilhões da Elea em São Bernardo do Campo e um hyperscale da Tecto em Santana de Parnaíba, que terá energia 100% renovável e um aporte inicial de US$ 1 bilhão⁴.

O Rio Grande do Sul⁵ também se insere no cenário, com a Scala Data Centers investindo R$ 3 bilhões na construção da Scala AI City em Eldorado do Sul, com potencial para alcançar 4,7 GW. O Paraná, Distrito Federal e Minas Gerais também são mencionados como regiões estratégicas, com a cidade de Maringá tentando atrair um grande data center por meio da criação de uma Zona de Processamento de Exportação (ZPE).

A infraestrutura de fibra óptica, desafios regulatórios e incentivos fiscais são elementos-chave na viabilização desses investimentos, e o crescimento do setor de data centers no Brasil reflete uma transformação digital acelerada e uma maior demanda por processamento e armazenamento de dados.

Apesar do potencial e das vantagens estratégicas, o Brasil enfrenta desafios significativos para o fomento e a expansão do setor de data centers. O principal obstáculo apontado pelo Mapeamento da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) é o custo elevado de implantação (CAPEX) e operação (OPEX), que são consideravelmente superiores aos de países vizinhos na América Latina. Em 2021, o CAPEX de um data center Tier 3 no Brasil era 25,9% superior ao do Chile e 52,6% maior que o da Argentina. A carga tributária é citada como o fator mais relevante para essa diferença, representando 23% do CAPEX e 27% do OPEX no Brasil, as maiores alíquotas regionais. A complexidade do sistema tributário brasileiro agrava essa situação, somada ao alto custo e à dificuldade de importação de equipamentos essenciais. Esses custos elevados podem tornar mais vantajoso para empresas brasileiras processar seus dados no exterior, impactando a competitividade internacional do país (ABDI, 2023).

Além dos custos tributários e de importação, os data centers demandam uma infraestrutura robusta de energia e refrigeração. A eletricidade é o maior custo operacional, e a crescente demanda de servidores para IA exige centenas de megawatts, elevando o consumo e os custos. A refrigeração é um desafio constante para garantir a eficiência e longevidade dos equipamentos, levando à busca por tecnologias como resfriamento líquido. A busca por energia 100% renovável, embora seja um objetivo para reduzir emissões, também representa um investimento necessário. Outro desafio importante é o desenvolvimento de capital humano qualificado para a operação e manutenção complexa dessas instalações.

Para superar esses obstáculos e capitalizar o potencial do país, o governo brasileiro propôs um conjunto de políticas públicas visando atrair investimentos vultosos para o setor. O cerne dessa estratégia é o Plano Nacional dos Data Centers, uma iniciativa que busca acelerar a expansão da infraestrutura e atrair cerca de R$ 2 trilhões em investimentos ao longo de dez anos. O principal mecanismo desse plano é o Regime Especial de Atração de Data Centers (Redata).

O Redata é um regime tributário especial em elaboração pelo governo federal, cujo objetivo é desonerar investimentos na implantação e expansão de data centers no Brasil. Ele prevê a isenção ou redução de tributos federais incidentes sobre a compra e importação de equipamentos essenciais para construção, modernização e operação, como IPI, PIS, Cofins e Imposto de Importação. Essa medida visa tornar a construção e expansão de data centers financeiramente mais atraentes, funcionando como uma antecipação de efeitos da reforma tributária para o setor.

Em contrapartida aos benefícios fiscais concedidos pelo Redata, os investidores deverão cumprir exigências estratégicas para o desenvolvimento nacional:

Sustentabilidade: Exige a adoção de práticas ambientais rigorosas, como o uso de energia 100% renovável e limpa (preferencialmente solar ou eólica), alta eficiência energética e hídrica (buscando “zero water”), circularidade e neutralidade de carbono. Isso alinha o fomento do setor a objetivos ambientais cruciais.

Reserva de Capacidade Doméstica: Pelo menos 10% da capacidade dos data centers beneficiados pelo Redata deve ser ofertada no mercado brasileiro para empresas, pesquisa, universidades ou políticas públicas. A doação dessa capacidade conta em dobro, com o objetivo de garantir que parte dessa infraestrutura beneficie diretamente a economia e a inovação locais.

Contribuição para Pesquisa: Os participantes do Redata devem destinar 2% da sua receita para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT), visando fomentar pesquisas específicas para o setor.

Assim, o Redata não se limita a atrair investimentos pela redução de custos, mas busca direcioná-los para que sejam sustentáveis e contribuam para o desenvolvimento tecnológico e a economia digital brasileira.

Além do Redata, há a necessidade de políticas públicas integradas e modelos de colaboração para fortalecer o setor de data centers no Brasil. A Política Nacional de Segurança Cibernética (PNCiber) desempenha um papel fundamental ao estabelecer um arcabouço regulatório sólido, garantindo segurança jurídica e proteção contra ameaças digitais. Sua incorporação nas estratégias de fomento ao setor reforça a posição do Brasil como um ambiente confiável para investimentos em infraestrutura tecnológica.

Outras medidas propostas e modelos de fomento incluem:

  1. Diálogo Estratégico e Governança: A criação de um Comitê Interministerial para facilitar o diálogo com o setor privado e o planejamento estratégico.
  2. Outros Incentivos Fiscais: Além do Redata, a avaliação de outras reduções tributárias, como impostos sobre energia, IPTU e importação.
  3. Financiamento Público: Oferta de linhas de crédito dedicadas, como a já existente de R$ 2 bilhões do BNDES, e outras formas de crédito tributário.
  4. Infraestrutura Compartilhada e Licenciamento Facilitado: A criação de “parques de data centers” ou zonas econômicas especiais (similar às ZPEs mencionadas no Nordeste) com infraestrutura previamente estruturada (energia, água, conectividade) e processos de licenciamento simplificados. Inspirados em modelos internacionais e na experiência brasileira com parques tecnológicos, esses parques visam reduzir incertezas, custos e prazos, tornando o país mais atraente para grandes estruturas. A colaboração no modelo da Tríplice Hélice (governo, empresas, universidades) é vista como crucial para o sucesso desses parques.
  5. A adaptação de bunkers da Segunda Guerra Mundial para data centers no Brasil é uma alternativa promissora, aproveitando sua estrutura robusta e localização estratégica em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. O Decreto 4.098, de 1944, exigia a construção desses abrigos, muitos dos quais ainda existem e foram reutilizados para outras funções. A conversão desses espaços pode garantir alta segurança física e resistência a desastres naturais, desde que sejam modernizados com infraestrutura adequada de energia, refrigeração e conectividade. O documentário Cyberbunker: Crimes na Internet exemplifica esse modelo na Alemanha, demonstrando sua viabilidade para operações digitais. No Brasil, a implementação desse conceito exigiria investimentos em tecnologia, energia renovável e conectividade para assegurar sua eficiência no mercado de infraestrutura digital (NETFLIX, 2023; SEAERJ, 2022).
  6. Investimento em Infraestrutura Crítica: Garantir investimentos públicos em redes de energia, fibra óptica e cabos submarinos para suportar a expansão dos data centers.
  7. Facilitação Regulatória: Implementar mecanismos para acelerar licenciamentos e garantir a segurança jurídica dos investimentos.
  8. Desenvolvimento de Capital Humano: Fomentar a oferta de cursos profissionalizantes e a adaptação de currículos universitários em parceria com instituições como SENAI e universidades, para formar a mão de obra qualificada necessária.
  9. Estímulo à Demanda: Incentivar a digitalização governamental e a adoção de serviços em nuvem nos setores público e privado, gerando demanda para os data centers instalados no país.
  10. Segurança Cibernética: Garantir a proteção dos data centers dentro do arcabouço da Política Nacional de Segurança Cibernética (PNCiber).

A superação dos desafios e o aproveitamento do potencial do Brasil no mercado de data centers dependem fundamentalmente da colaboração entre os setores público e privado. É necessário combinar o capital e a expertise privada com a capacidade estatal de prover infraestrutura, regular, incentivar e gerar demanda. Iniciativas como a desoneração tributária condicionada pelo Redata, a facilitação de processos, investimentos em infraestrutura e qualificação de pessoal, e o diálogo constante são manifestações dessa colaboração essencial para que o Brasil capitalize seu potencial e fortaleça sua posição global na era da Inteligência Artificial.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities

1. https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/bytedance-avalia-investimento-em-data-center-no-brasil-com-foco-em-energia-renovavel

2. https://www.datacenterdynamics.com/br/an%C3%A1lises/os-principais-projetos-de-data-centers-em-2025/ 

3. https://convergenciadigital.com.br/mercado/elea-faz-data-center-verde-para-inteligencia-artificial-no-rio-de-janeiro/

4. https://www.datacenterdynamics.com/br/an%C3%A1lises/os-principais-projetos-de-data-centers-em-2025/

5. https://investnews.com.br/negocios/a-vez-do-brasil-nos-data-centers-empresas-colocam-bilhoes-em-campo-a-espera-da-explosao-da-ia/

Referências

AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL (ABDI). Mapeamento Data Centers 2023. Brasília, DF, 2023.

BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (BNDES). BNDES lança linha de R$ 2 bilhões para data centers no Brasil. Brasília, DF, 11 set. 2024. Disponível em: https://www.bndes.gov.br. Acesso em: 12 maio 2025

BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. PBIA prevê R$ 500 milhões para data centers verdes que aliam tecnologia e sustentabilidade. MCTI, 20 fev. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/noticias/2025/02/pbia-preve-r-500-milhoes-para-data-centers-verdes-que-aliam-tecnologia-e-sustentabilidade. Acesso em: 10 maio 2025.

BYTEDANCE. ByteDance avalia investimento em data center no Brasil com foco em energia renovável. Ecommerce Brasil, 2025. Disponível em: https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/bytedance-avalia-investimento-em-data-center-no-brasil-com-foco-em-energia-renovavel. Acesso em: 13 maio 2025.

CONVERGÊNCIA DIGITAL. Elea faz data center verde para inteligência artificial no Rio de Janeiro. Convergência Digital, 2025. Disponível em: https://convergenciadigital.com.br/mercado/elea-faz-data-center-verde-para-inteligencia-artificial-no-rio-de-janeiro/. Acesso em: 13 maio 2025.

CNN BRASIL. Na disputa global por data centers, Brasil prepara incentivos fiscais. 28 abr. 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/na-disputa-global-por-data-centers-brasil-prepara-incentivos-fiscais/. Acesso em: 12 maio 2025.

DIÁRIO DO NORDESTE. Obras de data center de R$ 55 bilhões da Casa dos Ventos devem começar neste ano no Pecém, diz Elmano. [s.d.]. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/obras-de-data-center-de-r-55-bilhoes-da-casa-dos-ventos-devem-comecar-neste-ano-no-pecemdizelmano-1.3611910. Acesso em: 10 maio 2025.

DATACENTER DYNAMICS. Os principais projetos de data centers em 2025. DataCenter Dynamics, 2025. Disponível em: https://www.datacenterdynamics.com/br/an%C3%A1lises/os-principais-projetos-de-data-centers-em-2025/. Acesso em: 11 maio 2025.

FARIA, Adriana Ferreira de; HABER, Jeruza Alves; BATTISTI, Andressa Caroline De; DABROWSKA, Justyna; SEDIYAMA, Jaqueline Akemi Suzuki. Technology parks in Brazil: an analysis of the determinants of performance evaluation. International Journal of Innovation, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 30-67, jan./abr. 2022. Disponível em: https://doi.org/10.5585/iji.v10i1.19456. Acesso em: 10 maio 2025.

INFOMONEY. Brookfield busca sócio para Ascenty de olho na expansão de data centers no Brasil. InfoMoney, 2025. Disponível em: https://www.infomoney.com.br/business/brookfield-busca-socio-para-ascenty-de-olho-na-expansao-de-data-centers-no-brasil/. Acesso em: 11 maio 2025.

INVESTNEWS. A vez do Brasil nos data centers: empresas colocam bilhões em campo à espera da explosão da IA. InvestNews, 2025. Disponível em: https://investnews.com.br/negocios/a-vez-do-brasil-nos-data-centers-empresas-colocam-bilhoes-em-campo-a-espera-da-explosao-da-ia/. Acesso em: 13 maio 2025.

IT FORUM. Brasil lidera data centers Latam. [s.d.]. Disponível em: https://itforum.com.br/noticias/brasil-lidera-data-centers-latam/. Acesso em: 10 maio 2025.

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 11. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.

PENSO TECNOLOGIA. Crescimento dos Data Centers no Brasil: Oportunidades e Desafios. [s.d.]. Disponível em: https://www.penso.com.br/crescimento-dos-data-centers-no-brasil-oportunidades-e-desafios/. Acesso em: 10 maio 2025.

VEJA. Entenda o plano de R$ 2 trilhões de Haddad para atrair data centers para o Brasil. [s.d.]. Disponível em: https://veja.abril.com.br/economia/entenda-o-plano-de-r-2-trilhoes-de-haddad-para-atrair-data-centers-para-o-brasil/. Acesso em: 10 maio 2025.

ETZKOWITZ, Henry. The Triple Helix of University-Industry-Government Relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, set. 2003. DOI: 10.1177/05390184030423002.

NETFLIX. Cyberbunker: Crimes na Internet. Direção de Mark Wetzke. Alemanha, 2023. Disponível em: https://www.netflix.com.

TS SHARA. O desafio do mercado brasileiro de data centers. 2025. Disponível em: https://tsshara.com.br/blog/noticias/o-desafio-do-mercado-brasileiro-de-data-centers/. Acesso em: 12 maio 2025.
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Os data centers, ou centros de processamento de dados, são instalações físicas que constituem os pilares essenciais da infraestrutura digital contemporânea. Eles abrigam servidores, dispositivos de armazenamento e redes, sendo cruciais para o processamento e armazenamento massivo de dados digitais. Em uma era definida pela Sociedade da Informação e pela economia digital, na qual a informação digital e a internet são centrais, os data centers suportam desde buscas online e transações bancárias até aplicações avançadas em Saúde, Agronegócio, Indústria e Cidades. Com a explosão da demanda impulsionada pela Inteligência Artificial (IA) e a crescente digitalização, a necessidade por infraestrutura de data centers aumenta exponencialmente.

Nesse contexto global, a América Latina emergiu como uma “nova fronteira” para grandes investimentos no setor de data centers, e o Brasil se destaca como um player significativo. 

O Nordeste tem se consolidado como um pólo estratégico para a instalação de data centers, especialmente devido à abundância de energia renovável, como a eólica, e à proximidade de cabos submarinos que garantem alta conectividade. O Ceará lidera esse movimento, com projetos bilionários, incluindo um investimento de R$ 55 bilhões da Casa dos Ventos e negociações do governo estadual com empresas chinesas que podem injetar até R$ 50 bilhões na região. A ByteDance¹ avalia um grande empreendimento no complexo portuário de Pecém, enquanto outras empresas, como V.tal e Angola Cables, também investem na capital cearense. A HostDime planeja construir um novo data center edge TIER IV em João Pessoa².

O Rio de Janeiro recebe destaque com o ambicioso projeto Rio AI City, desenvolvido pela Elea Data Centers na região do Parque Olímpico³, que terá capacidade inicial de 1,5 GW, podendo atingir 3,2 GW. O projeto é apoiado pelo município e busca transformar a região do Parque Olímpico em um hub tecnológico. Há também estudos para levar investimentos ao Porto do Açu.

São Paulo continua sendo o maior centro de data centers do país, atraindo gigantes como Elea, ODATA e Tecto, que estão ampliando suas operações. Entre os projetos de destaque está um investimento de R$ 5 bilhões da Elea em São Bernardo do Campo e um hyperscale da Tecto em Santana de Parnaíba, que terá energia 100% renovável e um aporte inicial de US$ 1 bilhão⁴.

O Rio Grande do Sul⁵ também se insere no cenário, com a Scala Data Centers investindo R$ 3 bilhões na construção da Scala AI City em Eldorado do Sul, com potencial para alcançar 4,7 GW. O Paraná, Distrito Federal e Minas Gerais também são mencionados como regiões estratégicas, com a cidade de Maringá tentando atrair um grande data center por meio da criação de uma Zona de Processamento de Exportação (ZPE).

A infraestrutura de fibra óptica, desafios regulatórios e incentivos fiscais são elementos-chave na viabilização desses investimentos, e o crescimento do setor de data centers no Brasil reflete uma transformação digital acelerada e uma maior demanda por processamento e armazenamento de dados.

Apesar do potencial e das vantagens estratégicas, o Brasil enfrenta desafios significativos para o fomento e a expansão do setor de data centers. O principal obstáculo apontado pelo Mapeamento da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) é o custo elevado de implantação (CAPEX) e operação (OPEX), que são consideravelmente superiores aos de países vizinhos na América Latina. Em 2021, o CAPEX de um data center Tier 3 no Brasil era 25,9% superior ao do Chile e 52,6% maior que o da Argentina. A carga tributária é citada como o fator mais relevante para essa diferença, representando 23% do CAPEX e 27% do OPEX no Brasil, as maiores alíquotas regionais. A complexidade do sistema tributário brasileiro agrava essa situação, somada ao alto custo e à dificuldade de importação de equipamentos essenciais. Esses custos elevados podem tornar mais vantajoso para empresas brasileiras processar seus dados no exterior, impactando a competitividade internacional do país (ABDI, 2023).

Além dos custos tributários e de importação, os data centers demandam uma infraestrutura robusta de energia e refrigeração. A eletricidade é o maior custo operacional, e a crescente demanda de servidores para IA exige centenas de megawatts, elevando o consumo e os custos. A refrigeração é um desafio constante para garantir a eficiência e longevidade dos equipamentos, levando à busca por tecnologias como resfriamento líquido. A busca por energia 100% renovável, embora seja um objetivo para reduzir emissões, também representa um investimento necessário. Outro desafio importante é o desenvolvimento de capital humano qualificado para a operação e manutenção complexa dessas instalações.

Para superar esses obstáculos e capitalizar o potencial do país, o governo brasileiro propôs um conjunto de políticas públicas visando atrair investimentos vultosos para o setor. O cerne dessa estratégia é o Plano Nacional dos Data Centers, uma iniciativa que busca acelerar a expansão da infraestrutura e atrair cerca de R$ 2 trilhões em investimentos ao longo de dez anos. O principal mecanismo desse plano é o Regime Especial de Atração de Data Centers (Redata).

O Redata é um regime tributário especial em elaboração pelo governo federal, cujo objetivo é desonerar investimentos na implantação e expansão de data centers no Brasil. Ele prevê a isenção ou redução de tributos federais incidentes sobre a compra e importação de equipamentos essenciais para construção, modernização e operação, como IPI, PIS, Cofins e Imposto de Importação. Essa medida visa tornar a construção e expansão de data centers financeiramente mais atraentes, funcionando como uma antecipação de efeitos da reforma tributária para o setor.

Em contrapartida aos benefícios fiscais concedidos pelo Redata, os investidores deverão cumprir exigências estratégicas para o desenvolvimento nacional:

Sustentabilidade: Exige a adoção de práticas ambientais rigorosas, como o uso de energia 100% renovável e limpa (preferencialmente solar ou eólica), alta eficiência energética e hídrica (buscando “zero water”), circularidade e neutralidade de carbono. Isso alinha o fomento do setor a objetivos ambientais cruciais.

Reserva de Capacidade Doméstica: Pelo menos 10% da capacidade dos data centers beneficiados pelo Redata deve ser ofertada no mercado brasileiro para empresas, pesquisa, universidades ou políticas públicas. A doação dessa capacidade conta em dobro, com o objetivo de garantir que parte dessa infraestrutura beneficie diretamente a economia e a inovação locais.

Contribuição para Pesquisa: Os participantes do Redata devem destinar 2% da sua receita para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT), visando fomentar pesquisas específicas para o setor.

Assim, o Redata não se limita a atrair investimentos pela redução de custos, mas busca direcioná-los para que sejam sustentáveis e contribuam para o desenvolvimento tecnológico e a economia digital brasileira.

Além do Redata, há a necessidade de políticas públicas integradas e modelos de colaboração para fortalecer o setor de data centers no Brasil. A Política Nacional de Segurança Cibernética (PNCiber) desempenha um papel fundamental ao estabelecer um arcabouço regulatório sólido, garantindo segurança jurídica e proteção contra ameaças digitais. Sua incorporação nas estratégias de fomento ao setor reforça a posição do Brasil como um ambiente confiável para investimentos em infraestrutura tecnológica.

Outras medidas propostas e modelos de fomento incluem:

  1. Diálogo Estratégico e Governança: A criação de um Comitê Interministerial para facilitar o diálogo com o setor privado e o planejamento estratégico.
  2. Outros Incentivos Fiscais: Além do Redata, a avaliação de outras reduções tributárias, como impostos sobre energia, IPTU e importação.
  3. Financiamento Público: Oferta de linhas de crédito dedicadas, como a já existente de R$ 2 bilhões do BNDES, e outras formas de crédito tributário.
  4. Infraestrutura Compartilhada e Licenciamento Facilitado: A criação de “parques de data centers” ou zonas econômicas especiais (similar às ZPEs mencionadas no Nordeste) com infraestrutura previamente estruturada (energia, água, conectividade) e processos de licenciamento simplificados. Inspirados em modelos internacionais e na experiência brasileira com parques tecnológicos, esses parques visam reduzir incertezas, custos e prazos, tornando o país mais atraente para grandes estruturas. A colaboração no modelo da Tríplice Hélice (governo, empresas, universidades) é vista como crucial para o sucesso desses parques.
  5. A adaptação de bunkers da Segunda Guerra Mundial para data centers no Brasil é uma alternativa promissora, aproveitando sua estrutura robusta e localização estratégica em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. O Decreto 4.098, de 1944, exigia a construção desses abrigos, muitos dos quais ainda existem e foram reutilizados para outras funções. A conversão desses espaços pode garantir alta segurança física e resistência a desastres naturais, desde que sejam modernizados com infraestrutura adequada de energia, refrigeração e conectividade. O documentário Cyberbunker: Crimes na Internet exemplifica esse modelo na Alemanha, demonstrando sua viabilidade para operações digitais. No Brasil, a implementação desse conceito exigiria investimentos em tecnologia, energia renovável e conectividade para assegurar sua eficiência no mercado de infraestrutura digital (NETFLIX, 2023; SEAERJ, 2022).
  6. Investimento em Infraestrutura Crítica: Garantir investimentos públicos em redes de energia, fibra óptica e cabos submarinos para suportar a expansão dos data centers.
  7. Facilitação Regulatória: Implementar mecanismos para acelerar licenciamentos e garantir a segurança jurídica dos investimentos.
  8. Desenvolvimento de Capital Humano: Fomentar a oferta de cursos profissionalizantes e a adaptação de currículos universitários em parceria com instituições como SENAI e universidades, para formar a mão de obra qualificada necessária.
  9. Estímulo à Demanda: Incentivar a digitalização governamental e a adoção de serviços em nuvem nos setores público e privado, gerando demanda para os data centers instalados no país.
  10. Segurança Cibernética: Garantir a proteção dos data centers dentro do arcabouço da Política Nacional de Segurança Cibernética (PNCiber).

A superação dos desafios e o aproveitamento do potencial do Brasil no mercado de data centers dependem fundamentalmente da colaboração entre os setores público e privado. É necessário combinar o capital e a expertise privada com a capacidade estatal de prover infraestrutura, regular, incentivar e gerar demanda. Iniciativas como a desoneração tributária condicionada pelo Redata, a facilitação de processos, investimentos em infraestrutura e qualificação de pessoal, e o diálogo constante são manifestações dessa colaboração essencial para que o Brasil capitalize seu potencial e fortaleça sua posição global na era da Inteligência Artificial.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities

1. https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/bytedance-avalia-investimento-em-data-center-no-brasil-com-foco-em-energia-renovavel

2. https://www.datacenterdynamics.com/br/an%C3%A1lises/os-principais-projetos-de-data-centers-em-2025/ 

3. https://convergenciadigital.com.br/mercado/elea-faz-data-center-verde-para-inteligencia-artificial-no-rio-de-janeiro/

4. https://www.datacenterdynamics.com/br/an%C3%A1lises/os-principais-projetos-de-data-centers-em-2025/

5. https://investnews.com.br/negocios/a-vez-do-brasil-nos-data-centers-empresas-colocam-bilhoes-em-campo-a-espera-da-explosao-da-ia/

Referências

AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL (ABDI). Mapeamento Data Centers 2023. Brasília, DF, 2023.

BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (BNDES). BNDES lança linha de R$ 2 bilhões para data centers no Brasil. Brasília, DF, 11 set. 2024. Disponível em: https://www.bndes.gov.br. Acesso em: 12 maio 2025

BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. PBIA prevê R$ 500 milhões para data centers verdes que aliam tecnologia e sustentabilidade. MCTI, 20 fev. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/noticias/2025/02/pbia-preve-r-500-milhoes-para-data-centers-verdes-que-aliam-tecnologia-e-sustentabilidade. Acesso em: 10 maio 2025.

BYTEDANCE. ByteDance avalia investimento em data center no Brasil com foco em energia renovável. Ecommerce Brasil, 2025. Disponível em: https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/bytedance-avalia-investimento-em-data-center-no-brasil-com-foco-em-energia-renovavel. Acesso em: 13 maio 2025.

CONVERGÊNCIA DIGITAL. Elea faz data center verde para inteligência artificial no Rio de Janeiro. Convergência Digital, 2025. Disponível em: https://convergenciadigital.com.br/mercado/elea-faz-data-center-verde-para-inteligencia-artificial-no-rio-de-janeiro/. Acesso em: 13 maio 2025.

CNN BRASIL. Na disputa global por data centers, Brasil prepara incentivos fiscais. 28 abr. 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/na-disputa-global-por-data-centers-brasil-prepara-incentivos-fiscais/. Acesso em: 12 maio 2025.

DIÁRIO DO NORDESTE. Obras de data center de R$ 55 bilhões da Casa dos Ventos devem começar neste ano no Pecém, diz Elmano. [s.d.]. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/obras-de-data-center-de-r-55-bilhoes-da-casa-dos-ventos-devem-comecar-neste-ano-no-pecemdizelmano-1.3611910. Acesso em: 10 maio 2025.

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