Este artigo explora como a economia de dados e a Inteligência Artificial (IA) servem como suporte para a formulação de Políticas Públicas Baseadas em Evidências (PPBE). Foi formulado a partir de uma revisão sistemática e integrativa da literatura realizada nas bases Scopus e Web of Science. Os resultados indicam que a integração de grandes volumes de dados, analisados em tempo real pela IA, oferece potencial significativo para a elaboração de políticas públicas mais precisas e eficientes. Contudo, há desafios, como infraestrutura tecnológica, privacidade, segurança de dados e capacitação profissional, que precisam ser superados. Além disso, destaca-se a necessidade de uma abordagem ética e regulamentada para evitar o aprofundamento de desigualdades já existentes e garantir o uso responsável dos dados na formulação de políticas públicas.
A economia de dados emerge como um paradigma econômico multifacetado que vai além da simples coleta e análise de informações. Nesse contexto, os dados são ativos estratégicos comparáveis ao capital e ao trabalho, mas com características distintivas, como a não rivalidade, que possibilita seu uso simultâneo por múltiplos agentes econômicos (Börner et al., 2018; Cong, Xie & Zhang, 2021). Esse modelo fundamenta-se na aplicação de IA, Big Data e Business Intelligence, permitindo a otimização de processos decisórios em organizações e governos (Bodislav et al., 2018). Por outro lado, há desafios regulatórios e éticos, como o capitalismo de vigilância e os impactos sociais da monetização dos dados (White & Boatwright, 2020; Snell, Tarkkal & Tupasela, 2021). A partir de outra perspectiva, a característica sistêmica dessa economia destaca a necessidade de uma regulamentação capaz de equilibrar interesses comerciais e proteção de direitos individuais (Tang, Plasek & Bates, 2018).
Pois bem, a IA potencializa a economia de dados ao ampliar a análise de grandes volumes de informações, identificando padrões e tendências para fundamentar decisões estratégicas (Chang et al., 2024). A automação proporcionada por algoritmos permite respostas mais ágeis e precisas em setores como saúde, finanças e segurança pública (Wamba et al., 2018; Börner et al., 2018). A análise de grandes volumes de dados, coletados de diferentes formas hoje em dia, permite identificar padrões, antecipar demandas e personalizar ações governamentais, tornando a gestão pública mais ágil e responsiva. Além disso, a interoperabilidade entre diferentes níveis de governo possibilita a criação de sistemas integrados de informação, favorecendo a transparência, a participação social e a inovação nas políticas públicas (OCDE, 2023).
A crescente integração da IA nesse cenário fortalece a capacidade de análise e uso de grandes volumes de dados, promovendo políticas públicas mais precisas e adaptáveis. Países como o Canadá e membros da União Europeia já utilizam estratégias digitais para embasar políticas em tempo real, garantindo maior alinhamento com as necessidades populacionais (World Economic Forum, 2023; Government of Canada, 2018). O potencial dessa abordagem inclui a promoção da transparência, o fortalecimento da participação cidadã e a mitigação de vieses político-partidários (Mayer-Schönberger & Cukier, 2013).
Como aplicação, a economia de dados e a inteligência artificial (IA) têm permitido a formulação de políticas públicas baseadas em evidências (PPBE), impulsionando tomadas de decisão mais informadas e eficazes, por se basearem em uma análise mais completa de dados para otimizar recursos e ampliar o impacto social das políticas públicas. Essa abordagem, que foi impulsionada pelo avanço tecnológico e pelo movimento New Public Management (NPM), reforça a importância da tomada de decisões embasada em evidências empíricas (Fogaça et al., 2023). Exemplos ocorrem na saúde pública, com programas de imunização e triagem neonatal (Bronstein et al., 2019; Dabanch et al., 2019). No setor educacional, dados ajudam a personalizar. A integração multidisciplinar de evidências e a desconexão entre pesquisa acadêmica e formulação de políticas são apontadas como desafios (Loader & Sparks, 2014).
A implementação das PPBE enfrenta desafios éticos, sociais e tecnológicos. A proteção da privacidade dos dados das pessoas sugere políticas rigorosas de segurança de dados para evitar abusos e vazamentos (Elvy, 2017). Além disso, o viés algorítmico pode reforçar desigualdades e comprometer a justiça social, o que indica a necessidade de algoritmos mais claros e justos (Holm & Ploug, 2017). Nessa direção, Murtagh et al. (2022) reforçam que a transparência nos processos de IA é essencial para a construção da confiança pública e do controle social sobre as políticas formuladas.
Além disso, a desigualdade no acesso à tecnologia compromete a representatividade dos dados, exigindo iniciativas de inclusão digital para garantir políticas públicas mais equitativas (Sestino et al., 2023). Barreiras técnicas, como a interoperabilidade de sistemas governamentais, dificultam a integração de dados, demandando padrões comuns para melhorar a eficiência administrativa (Zech, 2016).
A pesquisa concluiu que a integração entre IA e economia de dados tem um potencial transformador para as PPBE, proporcionando decisões políticas mais fundamentadas e adaptativas (Börner et al., 2018). A personalização das políticas possibilita intervenções ajustadas às necessidades de diferentes segmentos populacionais, promovendo inclusão social (Lammi & Pantzar, 2019; Börner et al., 2018). Essa fusão promove maior eficiência e responsividade na gestão pública e, aprimora o monitoramento em tempo real das políticas implementadas (Tang et al., 2019).
Diante desse cenário, a consolidação das Políticas Públicas Baseadas em Evidências (PPBE) na era da economia de dados e da Inteligência Artificial exige um esforço contínuo para equilibrar inovação tecnológica e governança responsável. O avanço das ferramentas de análise de dados permite políticas mais eficazes e adaptáveis, mas demanda investimentos em infraestrutura, regulamentação e capacitação profissional para que seus benefícios sejam amplamente acessíveis. Assim, o futuro das PPBE dependerá não apenas da evolução tecnológica, mas também da capacidade dos governos de criar ambientes regulatórios que garantam transparência, ética e inclusão digital, assegurando que o uso de dados e IA contribua para uma gestão pública mais eficiente e equitativa.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities.

Dra. Ana Claudia Donner Abreu – Pesquisadora do Think Tank. Possui Graduação e Mestrado em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). É Doutora e Pós-doutora em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela UFSC onde é Pesquisadora Sênior do Laboratório de Engenharia e Governança do Conhecimento para Inovação. É Pesquisadora do Think Tank ABES/IEA-USP. Foi Professora na UFSC e na Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Foi Assessora Parlamentar na Câmara dos Deputados e Secretária de Relações Internacionais de Florianópolis. Entre seus temas de pesquisa estão o Futuro do Trabalho; Cidades Inteligentes; Educação Digital e Ecossistemas de inovação.