A era digital trouxe desafios e oportunidades sem precedentes para a administração pública brasileira. Como advogada atuante na área de direito público e observadora atenta das transformações digitais no setor governamental, tenho acompanhado a urgente necessidade de estabelecermos métricas objetivas para avaliar e impulsionar a jornada de transformação digital dos municípios brasileiros.
A transformação digital da administração pública não é mais uma opção, mas uma necessidade imperativa. Dados recentes demonstram que municípios com maior maturidade digital apresentam redução de até 40% nos custos operacionais e aumento significativo na satisfação dos cidadãos com os serviços públicos¹.
A ausência de métricas estruturadas, com dados primários e secundários, para acompanhar a evolução digital dos municípios brasileiros tem gerado disparidades significativas na qualidade dos serviços públicos e ineficiências na alocação de recursos. Enquanto algumas cidades já oferecem mais de 80% de seus serviços em formato digital, outras ainda mantêm processos inteiramente analógicos, criando um abismo digital que afeta diretamente a vida dos cidadãos².
Os impactos práticos desta disparidade são evidentes. Em municípios com baixa maturidade digital, cidadãos ainda enfrentam filas presenciais para serviços que poderiam ser resolvidos em minutos através de uma plataforma digital. Empresários perdem dias em processos burocráticos que, em cidades digitalmente maduras, são concluídos em horas. A falta de integração entre sistemas resulta em retrabalho, desperdício de recursos públicos e decisões baseadas em dados desatualizados ou inconsistentes.
Evidências empíricas demonstram ganhos substanciais com a digitalização estruturada³:
- Redução de 65% no tempo médio de atendimento ao cidadão
- Economia de 30% a 45% nos custos operacionais
- Diminuição de 70% no consumo de papel
- Aumento de 80% na transparência das informações públicas
- Redução de 50% no tempo de abertura de empresas
A implementação de métricas estruturadas de maturidade digital permite⁴:
- Diagnóstico preciso do estágio atual
- Planejamento baseado em evidências
- Alocação eficiente de recursos
- Monitoramento objetivo do progresso
- Comparabilidade entre municípios similares
Para o cidadão, os benefícios são imediatos e tangíveis⁵:
- Acesso 24/7 aos serviços públicos
- Eliminação de deslocamentos desnecessários
- Redução no tempo de resposta
- Maior transparência no acompanhamento de solicitações
- Canais integrados de atendimento
Para a administração municipal, os ganhos são expressivos⁶:
- Otimização de recursos humanos e financeiros
- Decisões baseadas em dados
- Melhor gestão do conhecimento
- Redução de erros operacionais
- Aumento na arrecadação por maior eficiência
A adoção de um framework técnico (considerando dimensões como: infraestrutura digital; serviços digitais; governança de dados; e ecossitema digital) permitiria não apenas um diagnóstico preciso da situação atual, mas também forneceria insights acionáveis para orientar os esforços de transformação digital. Municípios poderiam identificar áreas prioritárias de investimento, comparar seu desempenho com seus pares e medir o retorno sobre o investimento de suas iniciativas digitais.
Além disso, a disponibilização pública desses dados e análises promoveria maior transparência e engajamento cidadão, criando um ciclo virtuoso de melhoria contínua na prestação de serviços públicos digitais.
Nesse sentido, o marco legal brasileiro, especialmente a Lei 14.129/2021 que estabelece os principios, regras e instrumentos para o Governo Digital e o Decreto 12.198/2024 que trata da Estratégia Nacional de Transformação Digital, estabelece diretrizes claras para esta evolução.
A experiência internacional corrobora a necessidade de metrificar o digital. Países que implementaram sistemas de medição de maturidade digital municipal, como Estônia, Singapura e Portugal, apresentam índices de satisfação cidadã superiores a 85% e reduções significativas nos custos operacionais governamentais⁷.
O momento atual exige ação. A pandemia acelerou a demanda por serviços digitais e expôs as fragilidades dos municípios menos preparados. Aqueles que já possuíam maior maturidade digital demonstraram maior resiliência e capacidade de adaptação⁸.
A estruturação de métricas para acompanhamento da evolução digital municipal não é apenas uma questão de modernização administrativa, mas de justiça social e desenvolvimento econômico. Municípios digitalmente maduros atraem mais investimentos, geram mais empregos qualificados e oferecem melhor qualidade de vida aos seus cidadãos⁹.
O caminho para a transformação digital municipal passa necessariamente pela implementação de métricas digitais estruturadas de acompanhamento. Não se trata apenas de medir progresso, mas de garantir que os investimentos em tecnologia se traduzam em benefícios reais para a sociedade. O futuro da administração pública é digital, e precisamos garantir que todos os municípios brasileiros estejam preparados e orientados para essa realidade, com base em dados concretos e análises robustas.
¹Deloitte. "The journey to government's digital transformation". 2019. ²BNDES. "Transformação Digital de Governos Estaduais e Distrital". 2021. ³Banco Mundial. "Digital Government Readiness Assessment". 2020 ⁴OCDE. "Digital Government Index: 2019 results". 2020 ⁵Nações Unidas. "E-Government Survey 2020". 2020 ⁶Gartner. "Digital Government Benchmarks". 2021 ⁷e-Estonia Briefing Centre. "e-Estonia facts". 2022 ⁸FGV. "Impactos da Pandemia na Transformação Digital dos Municípios". 2021 ⁹Banco Interamericano de Desenvolvimento. "The Age of Digital Productivity". 2022
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autora, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities.

Líder do Grupo de Trabalho de Compras Públicas da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES)