O transporte é uma atividade meio e, para exercer sua função, é necessário que esteja disponível com equidade para todas as classes sociais.
Recentemente aqui no Rio de Janeiro, tivemos duas situações muito parecidas no transporte público que viralizaram nas redes sociais. O primeiro caso foi do ator Francisco Vitti que foi flagrado em um ônibus municipal e, no domingo (17/03), o do goleiro Fabrício do Nova Iguaçu, que após derrotar o Vasco no Maracanã e se classificar para as finais do campeonato carioca, foi visto e fotografado saindo de Metrô do estádio.
O que era para ser um fato normal e corriqueiro, causou espanto naqueles que presenciaram a situação de utilização dos serviços de transporte público por um ator e por um jogador de futebol. Através de suas redes sociais, o ator Francisco Vitti se disse espantado com a quantidade de mensagens recebidas o chamando de humilde, por estar andando de ônibus. A resposta do Francisco foi de que ele estava sendo inteligente e não humilde. Já o goleiro Fabrício, disse que isso faz parte da rotina da maior parte do elenco do time do Nova Iguaçu, e que andar de transporte público era uma coisa normal para eles. Mas qual seria o motivo de todo esse espanto por parte das pessoas que os viram no transporte público?
A função do transporte é promover conexão e acessibilidade. As pessoas precisam chegar e sair dos locais onde irão realizar suas atividades de trabalho, lazer e acessar os serviços públicos, como saúde e educação, por exemplo. O transporte é uma atividade meio e, para exercer sua função, é necessário que esteja disponível com equidade para todas as classes sociais.
No Brasil, o transporte público é visto como um serviço destinado para os pobres e para aqueles que não possuem outra opção. Isso tem um nome: o elitismo classista. Todo o espanto das pessoas foi no sentido de achar que atores e jogadores de futebol, que em tese pertencem a classes sociais mais altas, não deveriam ser vistas no transporte público.
A relação entre elitismo classista e transporte público no país é um reflexo das desigualdades sociais. O acesso e a qualidade do transporte público, em geral, são um reflexo das diferenças econômicas, onde as áreas mais privilegiadas recebem melhorias e investimentos, enquanto regiões periféricas sofrem com a falta de infraestrutura e serviços precários. Além disso, as tarifas muitas vezes representam um peso desproporcional para os mais pobres, limitando seu acesso a oportunidades e serviços essenciais.
Essa exclusão no transporte público perpetua um ciclo de desigualdade social, dificultando o acesso de comunidades marginalizadas a empregos, educação e outros serviços básicos. Para abordar esse problema, é crucial implementar políticas que visem a equidade no acesso ao transporte público, incluindo investimentos em infraestrutura nas áreas mais necessitadas, subsídios para tarifas e sistemas de transporte integrados que atendam às necessidades de todas as camadas da sociedade.
Na verdade, o transporte público é um serviço que tem inúmeros atributos que precisam ser mais bem explorados. É um meio muito menos poluente por passageiro que o transporte individual, ou seja, sua utilização é um ato de respeito ao meio ambiente. Necessita de menos espaço para transportar o mesmo número de pessoas, utilizando de forma mais eficiente os recursos públicos no desenvolvimento das infraestruturas. Causa muito menos acidentes de trânsito, evitando gastos desnecessários nos sistemas de saúde. Essas são apenas algumas das vantagens que podem ajudar a mudar a imagem do transporte público, deixando de ser visto como a única opção para os pobres para se tornar uma opção inteligente, como bem disse o ator Francisco Vitti.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities
Especialista em Mobilidade Urbana e Mobilidade Ativa, pós-graduado com MBA em engenharia de transportes pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e com formação em gestão pública pelo CLP em São Paulo, com módulo internacional na Kennedy School da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.
Atualmente ocupa o cargo de Vice-Presidente de Relações institucionais da SEMOVE. Atuou também como consultor em Mobilidade Urbana através da RT2 Consultoria, empresa que fundou em 2005. Ocupou o cargo de Secretário Extraordinário de Mobilidade Urbana de Porto Alegre entre 2019 e 2020 e foi presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana da ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos por dois mandatos, entre 2018 e 2021.
De 2013 a abril de 2019 atuou como secretário de Transporte e Trânsito de Juiz de Fora (MG), antes de assumir o seu primeiro cargo público fez parte da equipe da Sinergia Estudos e Projetos no Rio de Janeiro nos anos de 2002 a 2012.