Não bastasse esse enorme desafio que é dimensionar e gerir essa rede, a crise que vinha atingindo há alguns anos o setor de mobilidade agravou-se ainda mais com a pandemia causada pelo coronavírus.
Planejar a mobilidade urbana é uma tarefa de alta complexidade e, em geral, para problemas complexos não existe solução simples. É fundamental que os diversos atores que fazem parte do ecossistema possam interagir e trocar informações para que o desenho da rede atenda aos desejos de deslocamento da população. Além disso, deve haver racionalização para que os custos sejam acessíveis a todos e o sistema de mobilidade não gere exclusão social.
Não bastasse esse enorme desafio que é dimensionar e gerir essa rede, a crise que vinha atingindo há alguns anos o setor de mobilidade agravou-se ainda mais com a pandemia causada pelo coronavírus. O impacto foi tão significativo que o modelo de custeio do transporte público chegou ao seu limite de desgaste. Ainda durante a pandemia, iniciou-se a Guerra da Ucrânia, que trouxe aumento de preços de insumos essenciais para a mobilidade, como o diesel.
Essa crise atingiu, em maior ou menor proporção, os diversos estados brasileiros, mas o cenário no estado do Rio de Janeiro é ainda mais preocupante. Em todos os seus modos, as concessionárias dos serviços de transporte público passam por sérias dificuldades. A SuperVia, que opera o serviço de trens metropolitanos, está em recuperação judicial e acabou de fechar um acordo com o Estado em busca da viabilização da continuidade da prestação dos serviços. As barcas, que fazem o serviço aquaviário na Baía de Guanabara, se mostravam dispostas a paralisar as operações quando um acordo judicial permitiu que o serviço não fosse interrompido, garantindo o seu funcionamento por até mais dois anos. O metrô ainda não recuperou os níveis de demanda pré-pandemia e busca alternativas para que a tarifa não se torne inacessível para a população. Nos serviços de transporte por ônibus, aproximadamente 14% das empresas faliram e encerraram suas atividades, muitas outras se encontram em regime de recuperação judicial, o BRT do Rio de Janeiro está sob gestão pública após um período de intervenção.
Entretanto, é preciso chamar a atenção do leitor para o fato de que essa crise nas concessões do Estado do Rio de Janeiro não se restringe ao setor de mobilidade. A concessionária do Galeão está em processo de devolução do contrato, a Light enfrenta problemas de caixa e informou à Agência Nacional de Energia Elétrica que não tem condições de garantir a sustentabilidade das operações. Destaca-se que é vedado às concessionárias de energia elétrica a adoção do regime de recuperação judicial.
A maior parte dessas empresas concessionárias que enfrentam problemas muito graves por aqui também operam serviços concedidos em outros estados e países. Nas demais operações, no entanto, a situação não se parece com a que se vê no estado do Rio de Janeiro. Entender os motivos dessa crise sistêmica pode ser um bom caminho na busca de soluções para os problemas enfrentados atualmente.
Retomando o foco para o transporte público, o mesmo precisa ser enxergado por toda a sociedade como um direito social. É fundamental que seja dada segurança jurídica para que os atuais e futuros contratos de concessão sejam respeitados em sua plenitude por todas as partes: concessionário e poder concedente.
No primeiro parágrafo, mencionou-se que se tratava de um problema complexo, e não há mesmo soluções mágicas nem rápidas, mas esta talvez seja uma janela de oportunidade para se fazer um grande rearranjo institucional e de governança envolvendo toda a sociedade nessa discussão. É papel da SEMOVE promover esse debate e nos colocamos à disposição para buscarmos soluções viáveis para a mobilidade urbana no estado do Rio de Janeiro.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities
Especialista em Mobilidade Urbana e Mobilidade Ativa, pós-graduado com MBA em engenharia de transportes pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e com formação em gestão pública pelo CLP em São Paulo, com módulo internacional na Kennedy School da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.
Atualmente ocupa o cargo de Vice-Presidente de Relações institucionais da SEMOVE. Atuou também como consultor em Mobilidade Urbana através da RT2 Consultoria, empresa que fundou em 2005. Ocupou o cargo de Secretário Extraordinário de Mobilidade Urbana de Porto Alegre entre 2019 e 2020 e foi presidente do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Públicos de Mobilidade Urbana da ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos por dois mandatos, entre 2018 e 2021.
De 2013 a abril de 2019 atuou como secretário de Transporte e Trânsito de Juiz de Fora (MG), antes de assumir o seu primeiro cargo público fez parte da equipe da Sinergia Estudos e Projetos no Rio de Janeiro nos anos de 2002 a 2012.