*Por Roberto Speicys, CEO e fundador da Scipopulis
Imagine que estamos no final de 2023, na cidade de São Paulo, com todas as metas de redução nas emissões de gases do transporte público batidas. Acrescente a este cenário a expansão da oferta de transporte público, o término dos impactos da pandemia de Covid-19 e a retomada das atividades presenciais no nível pré-pandemia. Você consegue imaginar esse simples exercício como algo factível?
Para chegarmos no patamar citado acima — de melhora significativa da qualidade de vida e bem-estar populacional na capital paulista –, precisaríamos ter reduzido em 30%
as emissões de CO2, em 48% as de NOx e em 54% as de material particulado em comparação ao ano-base de 2016. Para isso, seria necessário ter avançado na disponibilidade de frota elétrica do transporte público que, a longo prazo, vai precisar ser totalmente implementada para conquistar todas as metas previstas.
O modelo ideal é uma hipótese que, por enquanto, está distante da nossa realidade. Com dois meses até o encerramento de 2022, temos apenas 1,6% de frota eletrificada — já deveríamos ter cerca de 15% a 25%. Caso não haja redução na oferta de serviços, a meta relativa aos óxidos de nitrogênio seria a mais difícil de ser alcançada em 2023.
Tivemos alguns avanços, mas ainda há muito a ser feito. Em termos da meta de emissões de CO2 para este ano – equivalente a 75% do emitido em 2016 -, estamos dentro do previsto, com cerca de 39% do limite estabelecido para o ano de 2022, de acordo com dados do painel de Emissões do Transporte Público desenvolvido pelo IEMA em parceria com a Scipopulis. Mas vale dizer que esse bom resultado se deve, principalmente, às mudanças de estruturação da rede de transportes e redução da oferta decorrentes dos impactos da Covid nos últimos dois anos.
Em 2016 – ano base estabelecido para as metas -, a frota total da cidade de São Paulo contava com mais de 14 mil veículos, enquanto o quantitativo atual circulante é de 13.425, representando cerca de 10% a menos.
Em termos de eletrificação, não houve muito progresso, já que evoluímos apenas 0,3% até agora. O pequeno aumento é decorrente da redução do total de ônibus nas ruas, e aponta para uma questão importante que mostra a necessidade de uma mudança radical no que já foi feito para que possamos seguir com cumprimento das metas.
Para termos uma ideia, dois anos depois da assinatura dos novos contratos entre os operadores de transporte, temos apenas 18 ônibus elétricos operando na cidade. A estimativa levantada pela Scipopulis é de que, até o momento, foram investidos cerca de R$ 40 milhões de um total de R$ 42 bilhões necessários para eletrificar toda a frota da cidade.
Em que se pese o impacto da pandemia de Covid-19 no transporte público, se acelerarmos 10 vezes o ritmo que tivemos até aqui pelos próximos 16 anos, ainda teremos apenas 1.440 ônibus elétricos circulando pela cidade — o que representaria apenas cerca de 10% da frota eletrificada em 2038.
Cumprimento das metas
Além das determinações da cidade de São Paulo, existem ainda as estaduais e federais que seriam comprometidas, caso não sejam cumpridas as metas de descarbonização do transporte público. Esse atraso prolongaria os efeitos da poluição na saúde da população, conforme levantamento por Hannah Ritchie e Max Roser no site Our World in Data. A pesquisa aponta que, das cinco principais causas de morte no Brasil, quatro estão diretamente relacionadas à poluição.
Se quisermos avançar e nos aproximarmos de locais como Santiago, Bogotá, Shenzhen (China), e cidades da Alemanha, Reino Unido e França, é mais do que urgente investirmos em uma mobilidade urbana gerida por dados que forneçam relatórios robustos de quais caminhos são mais eficazes para o cumprimento dos objetivos previstos, seja quanto às emissões no transporte público ou quanto à eletrificação dos veículos disponíveis.
O caminho é longo, mas a cada passo dado nos movimentamos em direção ao futuro que sonhamos e que o planeta merece.