Observo que diversas mudanças aconteceram nos últimos meses e o espaço urbano é uma delas. Essas quebras de paradigmas vão impactar a economia e o futuro do planeta e já modificaram o dia a dia de muita gente
Questionamos muito sobre como será a nova rotina no pós-pandemia, mas para milhões de pessoas, o home office não é uma realidade. Para muitos profissionais, a rotina de ida ao trabalho seguiu normalmente até agora e, para tantos outros, o retorno ao escritório já é uma volta à antiga rotina. Por isso, precisamos olhar além do cotidiano do trabalho ou lazer. Observo que diversas mudanças aconteceram nos últimos meses e o espaço urbano é uma delas. Essas quebras de paradigmas vão impactar a economia e o futuro do planeta e já modificaram o dia a dia de muita gente.
Desde a queda na emissão de CO2 na atmosfera até a constatação da redução no engarrafamento de trânsito nos principais centros urbanos, a pandemia trouxe reflexões e acelerou planos públicos relacionados à mobilidade e espaço urbano. Ao longo do ano, testemunhamos parcerias estratégicas entre empresas, lançamentos de produtos e inovações tecnológicas na indústria de mobilidade ativa. Exemplos disso foram as novas bikes elétricas no mundo, inclusive o nosso lançamento, que é o maior da América Latina, no formato de compartilhamento e estações fixas.
Embora tenha havido uma enorme evolução em curto prazo, o foco agora precisa estar em como manter todos esses ganhos e novos hábitos, especialmente em um momento em que as campanhas de vacinação avançam e as pessoas estão mais nas ruas, com a reabertura total dos comércios em algumas cidades.
Um erro recorrente que sempre ressalto é o olhar voltado apenas para uma questão específica, como solução, uma vez que a reinvenção do espaço público passa por diversos fatores. No último artigo, trouxe o exemplo do carro elétrico, que consegue proporcionar redução de CO2 e evitar aglomeração de pessoas, mas que também não soluciona o problema de espaço viário das cidades.
Autoridades de San Nicolas, uma cidade no norte do México, estão apostando em uma série de iniciativas rápidas de se cumprir e de baixo custo para criarem espaços públicos amigáveis e seguros para pessoas e ciclistas, é o chamado “Placemaking Plan SNG2030”. O projeto propõe novas formas de gerir, desenhar e habitar o espaço público por meio de sua renovação, ações que a cidade identificou como um elemento central da recuperação pós-pandemia.
Em uma análise da ONG norte-americana Center For an Urban Future, mostrou que o longo caminho que Nova York enfrenta para uma recuperação econômica plena e equitativa, e por isso precisa de ideias ousadas e viáveis que possam ser implementadas agora. Melhorar a mobilidade e criar espaços ao ar livre proporcionará às cidades uma série de incentivos, economizando tempo e recursos na comparação com intervenções de grande escala. O relatório explica que, para começar, as autoridades municipais devem identificar oportunidades no intervalo de pelo menos cinco e dez ruas e transformá-las em “ruas do povo”, além da implementação de ônibus elétricos e bondes e mais infraestrutura para bikes. Outro ponto levantado foi que a cidade também deve remover os carros privados da Ponte do Brooklyn e ter apenas mobilidade elétrica pública e compartilhada, ciclovias e muito mais capacidade para pedestres.
Planos estão de fato sendo traçados e um exemplo disso é o novo programa do MTur, que vai fomentar o cicloturismo em cem cidades. A meta do Governo Federal é chegar a 10.500 km nos próximos anos e movimentar o turismo em mais 2 milhões de pessoas por ano. Embora seja possível notar no Brasil o aumento de campanhas, ações e incentivos sobre o aproveitamento do espaço urbano, ainda estamos muito longe do ideal e do que está sendo construído no exterior. A oportunidade foi dada, precisamos aproveitá-la bem para que o desenvolvimento das cidades inteligentes seja completo. Estamos vivendo uma inércia mascarada por planos. O discurso precisa virar prática.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities
Sócio-fundador e COO da Tembici, empresa líder em micromobilidade na América Latina. Especialista em mobilidade urbana e precursor da entrada da tecnologia de bicicletas compartilhadas com estações no Brasil, tendo criado e implementado o projeto PedalUSP, o primeiro sistema de compartilhamento de bikes da Universidade de São Paulo.