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GOVERNO DIGITAL: ESSA LEI VAI PEGAR?

Iria Almeida
Iria Almeida
Head de Relações Governamentais do Colab, com ações nas áreas de cidades inteligentes e inovação na gestão pública. Atuou como secretária do Gabinete de Governança da Prefeitura Maceió e presidente do Conselho Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, além de vice-presidente de Desenvolvimento Regional do Fórum Inova Cidades (Frente Nacional dos Prefeitos) e elaboração da Carta Brasileira para Cidades Inteligentes.

A transformação digital dos serviços públicos brasileiros num curto espaço de tempo

As ideias e insights para a elaboração deste artigo surgiram no decorrer das últimas semanas com duas experiências: uma no campo profissional (uma live sobre governo digital) e a outra, acadêmica (nas aulas do curso Relações entre organizações públicas e privadas em um mundo conectado, INSPER). A indagação sobre a aplicabilidade da Lei Federal N° 14.129/2021, a famosa Lei de Governo digital, foi a primeira pergunta feita na Live que mencionei anteriormente e dela decorreram dois fatos que me trouxeram até aqui. O primeiro refere-se ao costume que temos de considerarmos determinadas peças legais como adornos da gestão pública, bonitos, imponentes, mas sem eficácia. A aplicabilidade parece passar longe da realidade da administração pública brasileira que até nos questionamos sobre a necessidade das suas existências.



O segundo fato diz respeito a nossa própria incredulidade com o sistema legal brasileiro. Porque têm leis que “pegam” e leis que “não pegam”? Milton Seligman em aula ministrada no dia 04 de agosto de 2021, para o curso Relações entre organizações públicas e privadas em um mundo conectado apontou que “Governos são percebidos como centros de serviços públicos e avaliados pela sua capacidade de entregar e expandir os serviços”. Nesta perspectiva, a visão ideológica não domina a relação do cidadão com o governo e as regulamentações passam a ser produtos das articulações da sociedade organizada em redes. Concluindo a parte mais teórica deste raciocínio, trago a premissa de que “a melhor maneira de um governo criar valor para a sociedade é fortalecendo suas instituições” (SELIGMAN, Milton, em sala de aula virtual, 04 de agosto de 2021).

Vejamos o caso prático do Gov.Br, portal único do governo que “reúne, em um só lugar, serviços para o cidadão e informações sobre a atuação de todas as áreas do governo”.  O portal tem mais ou menos 02 anos e rapidamente foi difundido como a uma excelente prática em oferta de serviços públicos digitais, tornou-se mais que um portal, e hoje me parece uma marca independente do governo atual que, pela qualidade do seu produto, não sofre com a perda de credibilidade na gestão pública federal, pelo contrário, agrega valor à qualidade dos serviços oferecidos aos estados e municípios credenciados à Rede Gov.Br.

Klaus Schwab, em A Quarta Revolução Industrial (2016), diz que “… a ciência está progredindo tão rapidamente que as limitações são menos tecnológicas do que legais, regulatórias e éticas”. Trazendo a discussão para a esfera pública, concordo que há descompasso temporal nas transformações administrativas e no sistema regulatório brasileiro, mas creio que não foi exatamente isso que aconteceu com o portal único de serviços brasileiro e a nossa Lei de Governo Digital. Mesmo lançado dois anos antes da publicação da Lei de Governo Digital (2021), o Gov.Br foi desenvolvido num ambiente lastreado, por exemplo, no Código de Defesa do Usuário do Serviço Público (Lei Federal N° 13.460/2017) e na Lei Geral de Proteção de Dados (Lei Federal N° 18.709/2018). A discussão sobre a Lei de Governo Digital também é fortalecida por essa ambiência e se torna Projeto de Lei em 2017.

O fato é que a pandemia do coronavírus em 2020 coloca em cheque toda a capacidade da administração pública de se reinventar, acelerando a mudança na lógica da oferta e prestação dos serviços públicos. O processo de transformação digital já estava muito fortalecido e difundido nas políticas públicas voltadas aos CNPJs (como por exemplo a REDESIM), mas pouco se falava do serviço para CPFs. Ouso apontar, mas sem registros ou bibliografia que comprove, que a oferta do auxílio emergencial deva ter sido o serviço público digital com maior impacto na vida do brasileiro. A discussão sobre a qualidade, conectividade e acesso a esse serviço ficarão para um próximo artigo.

É só coisa de momento?

Esse é o momento de responder a pergunta que nos fiz. Eu acredito de fato que o governo digital é condição efetiva na prestação de serviço público. O digital não surge como uma escolha, surge como ferramenta essencial na distribuição de serviços públicos pelo território brasileiro e, até, para além dele. A questão chave para a qualidade e equidade na prestação desses serviços é a promoção de políticas públicas inclusivas e educativas de acesso a internet e infraestrutura digital. A realidade está posta. Basta agora esperar para ver como gestores e gestoras públicas irão tratar do assunto, como Política de Governo ou como Política de Estado.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities  

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