Fortaleza amplia frota do transporte coletivo urbano nacional em circulação e se transforma em exemplo nacional
Um ano depois do início da pandemia do novo coronavírus no Brasil, o que poderia ter sido um período pródigo e de evolução para o transporte coletivo nacional, acabou representando o oposto. Mais do que isso, trouxe à tona problemas crônicos relacionados à qualidade, eficiência e, agora, à segurança, do transporte coletivo público urbano.
Em contraponto, as cidades de Fortaleza, no Ceará, e Brasília, Capital Federal, se destacam como exemplos positivos do que poderia ser um serviço eficiente, seguro, pontual e com o distanciamento que a sociedade precisa neste momento para parar de ver o transporte coletivo como um vilão na pandemia.
Brasília manteve durante todo o tempo 100% da frota em operação, mesmo tendo registrado 50% de queda na demanda diária, em relação do ano passado. Atualmente, o volume de passageiros é de cerca de 625 mil embarques, contra 1,244 milhão de embarques registrados no mesmo mês de 2020.
Na capital cearense, a prefeitura decidiu ampliar, por dois meses, a frota em pouco mais de 15%, com a contratação de 200 unidades adicionais para garantir ônibus sem lotação e redução no tempo de espera bem como na concentração de pessoas nos terminais. O resultado é que 95% das linhas não têm aglomeração e os passageiros esperam pouco tempo para a chegada do veículo.
Mesmo com a ampliação da frota, Fortaleza ainda está longe do cenário ideal em termos de equilíbrio e viabilidade do sistema. O acréscimo de 200 ônibus é um ótimo exemplo e sinal positivo de avanço na compreensão da gestão municipal da responsabilidade que tem na qualidade e padrão do serviço. Para que o transporte coletivo alcance o nível que a população deseja e necessita é preciso avançar em como sustentar o serviço, pois o valor arrecadado com a tarifa é menor que o custo efetivo.
Segundo Dimas Humberto Silva Barreira, presidente executivo do Sindiônibus (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará), apenas em algumas linhas ainda existe concentração em horários de pico, mas a adoção de mais veículos foi fundamental para alcançar o distanciamento social necessário e para elevar o padrão de qualidade e eficiência do transporte público.
Como comparação, em fevereiro de 2020, antes da pandemia, eram 1.751 ônibus operando para transportar 22 milhões de passageiros. Um ano depois, em fevereiro passado, 1.549 veículos transportam menos de 12 milhões de passageiros. São 7.746 pessoas transportadas por veículo, contra 12.560 há um ano, com 38% a mais de espaço para o distanciamento dentro dos ônibus, em média.
Na maioria das grandes cidades brasileiras, houve a decisão equivocada de redução da frota circulante para evitar aportes financeiros e diminuir o custo que os municípios teriam que arcar caso 100% dos veículos estivessem em operação, mesmo com o menor volume de passageiros. “Essa escolha coloca em risco o futuro de um dos mais importantes meios de transporte para a sociedade brasileira, em razão do desequilíbrio econômico-financeiro, uma vez que a forma de remuneração dos operadores é por tarifa de ocupação e não pelo real custo operacional do serviço”, alerta Dimas Humberto Silva Barreira.
No atual cenário, o operador concessionário não tem fôlego financeiro para manter a continuidade do serviço e nem investir em melhorias, sobretudo na modernização dos veículos, ou infraestrutura que permita tornar o modal mais veloz, eficiente, seguro e pontual. A queda de receita registrada desde março do ano passado levou muitos a uma situação de quase inadimplência.
O transporte coletivo público é obrigação do poder concedente, no caso a prefeitura de cada município. É o governo municipal que define os critérios do serviço a ser prestado assim como a forma de remuneração das empresas concessionárias. Com as restrições de recursos no orçamento das cidades, o transporte coletivo recebe cada vez menos investimentos e o serviço não se paga e nem se sustenta.
Os quatro bilhões de reais que seriam destinados às empresas para enfrentamento da pandemia e melhoria dos padrões do transporte coletivo brasileiro não saíram e a situação em todo o País é gravíssima, podendo levar ao colapso do sistema em muitas cidades. O aporte de recursos para o transporte coletivo poderia garantir o bem-estar, a saúde e a segurança da população. O resultado é que, em todo o País, está ocorrendo o definhamento e sucateamento da frota de veículos urbanos.
Exemplo europeu
Na Europa e nos Estados Unidos, o transporte coletivo recebeu grande aporte de recursos, justamente para garantir a segurança dos usuários que precisam se locomover. Nesses países, a tarifa cobrada representa apenas entre 10% e 50% do valor do serviço. O passageiro paga de 2 a 6 euros ou dólar e o restante para cobrir o custo total de cerca de 11 euros ou dólares é pago pelo governo. O transporte coletivo público brasileiro não se sustenta apenas com o valor da tarifa que, para cobrir os custos, precisaria ser muito mais alta, especialmente considerando-se a necessidade de diminuir a taxa de ocupação dos ônibus.
Em Fortaleza, 11 empresas operam o sistema urbano, com aproximadamente 1.780 ônibus e idade média de sete anos (o contrato “exige” idade média máxima de 4,5 anos). Desse total, 655 veículos têm ar-condicionado (aproximadamente 37%), mas durante a pandemia estão operando sem o sistema ligado. A renovação de frota foi de menos de 10% nos últimos três anos.
O valor despendido pela Prefeitura de Fortaleza para a adição desses 200 veículos na frota circulante é de cerca de cinco milhões de reais por mês. A tarifa cobrada atualmente está em 3,60 reais, mas para que o serviço fosse viável economicamente o valor precisaria ser de cerca de 5 reais.
O transporte público é essencial para o perfeito funcionamento das cidades e para a mobilidade da população, sobretudo a economicamente ativa e que gera e produz riquezas para o país. Sem o transporte coletivo não haverá retomada econômica, pois é fundamental para que tudo funcione, para que as pessoas cheguem aos seus trabalhos e para evitar os congestionamentos que haveria se as pessoas utilizassem somente o transporte individual.