Seria muito bom viver em cidades que criaram soluções criativas para lidar com os novos desafios
Aconteceu algo muito ruim na minha cidade natal: o alto volume de chuvas fez com que muitas avenidas virassem rios. A destruição do patrimônio público e privado foi imenso. E, infelizmente, ocorreram mortes decorrentes dessas enchentes. Para piorar a situação, também ocorrem deslizamentos em áreas de risco na periferia. A situação não era favorável, pois, nos próximos dias, aconteceria o Carnaval. E eventos dessa natureza sempre geram negócios e oportunidades para o comércio local. Mas tínhamos mais uma notícia indesejada: o número de casos de Dengue batia novo recorde.
De quem seria a responsabilidade sobre tudo isso? Era início de um novo governo. O atual gestor, que se elegeu apontando os erros da gestão anterior, disse que essas situações eram algo que fugiam do controle orçamentário, decorrente da má gestão do seu antecessor.
Essa história soa vagamente familiar? Você saberia dizer de qual cidade estou falando? Poderia ser a “SUA” cidade natal?
O ponto é que poderia ser várias cidades do Brasil ou do Mundo.
Enfim, essas situações ocorrem em várias cidades e, muitas vezes, por muitos anos seguidos, normalmente nos mesmos períodos do ano.
O que isso nos mostra?
Que são fenômenos cíclicos, sazonais, passíveis de serem previstos e de serem planejadas ações de enfrentamento e de mitigação das consequências.
Só que a grande maioria das cidades lida com esses temas de maneira linear, fragmentada e com soluções paliativas, pontuais e temporárias.
Quando um “problema” precisa ser resolvido a cada ano, a cada 4 anos ou a cada estação do ano, é claro que não podemos nos surpreender que o “problema” voltou a acontecer. Na verdade, precisamos entender a sua origem, os fatores nos quais podemos atuar (e aqueles sob os quais não temos controle) e assim buscar soluções e adequações mais sustentáveis, duradouras.
Cidades que possuem enchentes em áreas urbanas todos os anos, não podem achar que basta “culpar” o fenômeno natural, tapar os buracos e indenizar aqueles que tiveram prejuízo materiais. Isso não é o suficiente. Na próxima chuva de proporções similares, o problema tornará a acontecer, ou seja, não houve solução.
Os melhores gestores são aqueles que se preocupam mais com o seu legado do que com sua popularidade. Soluções de verdade são parte de um legado. Elas acabam sendo replicadas e até melhoradas pelas gestões seguintes, mesmo de adversários políticos.
Para não ficar apenas no apontamento dos problemas e do grande erro habitual dos planos de governo municipal, de tentar “remédios” populares e de efeitos temporários para problemas recorrentes e complexos das cidades, vamos ver algumas soluções reais que já são implementadas em diferentes lugares do mundo.
Como resolver o problema?
Para lidar com as enchentes, algumas cidades criaram parques lineares às margens dos rios urbanos. Esses parques lineares criam corredores verdes, conectando áreas da cidade com um paisagismo pensado para reunir as famílias, serem locais de contemplação e descanso e por isso, de maneira quase universal valorizam áreas urbanas antes degradadas. Geram atrativos econômicos e se tornam uma solução sustentável do ponto de vista ambiental, econômica e social. Dentre centenas de bons exemplos pelo mundo, gosto do caso do parque linear “Domino” localizado no Brooklyn, em Nova York. O Parque é uma homenagem às famílias dos trabalhadores de uma antiga fábrica de açúcar que existia no local.
Queria muito poder falar de um grande legado deixado por algum gestor. Algo que destaque as belezas da região ou melhore a vida das pessoas que nela vivem. Seria muito bom viver em cidades que conseguiram lidar antecipadamente com os problemas previsíveis e criaram soluções criativas para lidar com os novos desafios.
Precisamos de gerações de gestores eleitos, e por isso precisamos de gerações de eleitores, que pensem em legado, propósito e benefícios de médio e longo prazo.
As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões do Connected Smart Cities
CEO da Hubse Tecnologia da Informação, responsável pelo Instituto GEOeduc e execução dos treinamentos da Academia GIS Imagem (Esri BR). Professor na FGV, PUC, FACENS e IBEC.
Coordenou o premiado projeto de SmartCity #CIHE2030, em Monteiro Lobato/SP. Atuação nos campos da licenciatura, bacharelado e empreendedorismo e consultor em gestão do conhecimento e geotecnologias.